TJRJ. HABEAS CORPUS. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. AMEAÇA E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGAÇÃO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO QUE DECRETOU A CUSTÓDIA CAUTELAR, AUSÊNCIA DE PROVAS DE AUTORIA E MATERIALIDADE, BEM COMO OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA HOMOGENEIDADE E PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.
Ao que revelam os autos, em razão de ameaças e injúrias feitas pelo paciente, foram deferidas no dia 22/09/2023, nos autos do processo de origem 0114013-04.2023.8.19.0001, as medidas protetivas de proibição de contato e aproximação no limite mínimo de 300 metros em favor da vítima. Posteriormente, a vítima compareceu novamente à Delegacia de Polícia e realizou novo Registro de Ocorrência ( 119-02054/2023), informando que estava sendo ameaçada pelo ora paciente, que disse em 28/12/2023: «EU VOU TE MATAR NA FRENTE DESSAS DUAS CRIANÇAS, VOCÊ SAIU DE CASA PARA FICAR COM UM HOMEM» (e-doc. 000148, processo de origem 0114013-04.2023.8.19.0001). Declarou, ainda, que o paciente, de tempos em tempos, ia até a sua casa e jogava pedra na sua janela (que se encontra com o vidro quebrado), o que gerou a concessão de novas medidas protetivas no bojo do processo de 0000988-76.2024.8.19.0001 (doc. 148, processo de origem 0114013-04.2023.8.19.0001). Em seguida, o Parquet representou pela custódia cautelar e o magistrado de piso decretou a prisão preventiva do paciente (docs. 000146 e 000202, processo de origem 0114013-04.2023.8.19.0001). Conforme se infere do decreto prisional, «foram deferidas medidas protetivas em favor da ofendida em 22/09/2023, consistentes na proibição de aproximação da ofendida, seus familiares e testemunhas, devendo manter distância mínima de 300 metros e proibição de contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação, além de afastamento do lar. O requerido foi intimado das medidas protetivas em 25/09/2023 (fl. 45 daqueles autos). A narrativa da requerida, corroborada pelo registro de ocorrência e pelas fotografias e declarações juntadas nos autos 0000988-76.2024.8.19.0001, havendo fortíssimos indícios de que o requerido esteja sistematicamente descumprindo as protetivas deferidas no processo 0114013-04.2023.8.19.0001. Portanto, a configuração dos requisitos do cabimento da medida prisional está perfeitamente evidenciada, como demonstrado na decisão atacada, a qual ressaltou a necessidade da decretação da prisão preventiva do paciente para resguardar a integridade física e psicológica da vítima, bem como assegurar a efetividade de suas decisões, além da adequada aplicação da Lei penal e tutelar a ordem pública, ante a aparente reiteração criminosa. O periculum libertatis, ou seja, o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado (CPP, art. 312), está evidenciado conforme destacado no decisum, uma vez que há fortes indícios de que o paciente, de forma reiterada, descumpriu as medidas protetivas anteriormente fixadas em favor da vítima, eis que continuou a perseguir a vítima, entrando em contato, jogando pedras em sua residência e chegou ao ponto de jogar óleo misturado com gasolina por debaixo da porta da sala da casa da ofendida (doc. 000146, processo de origem 0114013-04.2023.8.19.0001). Há, ainda, menção pelo Parquet ao relatório de atendimento psicológico devidamente assinado pela profissional, juntado pela ofendida, que evidencia o trauma sofrido e toda violência perpetrada pelo paciente (doc. 000146, processo de origem 0114013-04.2023.8.19.0001). Não se pode olvidar que a Lei Maria da Penha tem como escopo a proteção da mulher que se encontra em situação de vulnerabilidade, sendo certo que a prisão preventiva é um dos mecanismos que pode ser utilizado para a preservação da integridade física e psicológica da vítima (Lei 11.343/2006, art. 12-C, 2º). Em consonância com o disposto na Lei, art. 12-C, § 2º 11.340/2006, acrescido pela Lei 13.827/2019, «Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso», o que se aplica ao caso vertente, no qual restou evidenciada uma personalidade recalcitrante no descumprimento das determinações judiciais, a autorizar a decretação da custódia cautelar. Nesse sentido, entende o STF que «ante o descumprimento de medida protetiva de urgência versada na Lei 11.340/2006, tem-se a sinalização de periculosidade, sendo viável a custódia provisória» (HC 169.166, Relator Ministro MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 17/9/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-214 DIVULG 01/10/2019 PUBLIC 2/10/2019). Quanto à alegação de ausência de provas de autoria e materialidade, trata-se de questionamento de aspectos probatórios que necessitam de análise aprofundada da matéria de fundo, próprios ao mérito da ação penal, tornando inviável a sua apreciação por esta via de cognição sumária. No tocante à suposta violação ao princípio da homogeneidade, trata-se de prognóstico que somente pode ser constatado após o julgamento definitivo da ação penal, não sendo possível inferir, nesse momento processual e nesta estreita via, o quantum de pena e o eventual regime prisional a ser fixado em caso de condenação, pois tudo isso depende de ampla dilação probatória, o que não se coaduna com a finalidade do presente instrumento constitucional. Por fim, como bem colocado no parecer da Procuradoria de Justiça, «no tocante ao paciente ser genitor de menor, não restou demonstrado que se trata de único familiar capaz de lhe prestar os devidos cuidados e suporte financeiro. Certo é que os meios disponíveis e possíveis serão utilizados na seara própria para resguardar o melhor interesse da criança". ORDEM CONHECIDA E DENEGADA, nos termos do voto do Desembargador Relator.
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