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DOC. 111.1761.1586.7614

TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO E RECEPTAÇÃO. LEI 11.343/2006, art. 33 E ART. 180, CAPUT, N/F DO ART. 69, AMBOS DO CP. RECURSO DEFENSIVO QUE NÃO SE INSURGE CONTRA A CONDENAÇÃO, ATACANDO, EXCLUSIVAMENTE, A DOSIMETRIA, DESEJANDO SUA REVISÃO COM VISTAS À REDUÇÃO DA PENA BASE, O RECONHECIMENTO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO, AO ARGUMENTO DE QUE, CONFESSADAMENTE ERA «MULA» REALIZANDO O TRANSPORTE DA DROGA, COM O OBJETIVO DE RECEBER R$ 1.500,00 (HUM MIL E QUINHENTOS REAIS) E ABRANDAMENTO DO REGIME APLICADO.

Os autos demonstram que no dia 11 de fevereiro de 2023, por volta das 17h50min, na Travessa Braga, Barreto, Niterói, Policiais Rodoviários Federais desconfiaram de um veículo Renault Logan, cor branca, placa PZT3H80, com insulfilm bem escuro nos vidros, que trafegava na descida da Ponte Rio-Niterói, e deram ordem de parada ao condutor, que desobedeceu e acelerou em fuga. Deu-se início à perseguição, logrando os agentes realizarem a abordagem na Travessa Braga, no bairro Barreto. Indagado, o apelante de pronto informou aos policiais que transportava uma grande quantidade de entorpecentes. Na mala do veículo os agentes encontraram 29.400g - vinte e nove mil e quatrocentos gramas de maconha, acondicionados em 980 (novecentos e oitenta) unidades; e 4.837g (quatro mil oitocentos e trinta e sete gramas) de cocaína, acondicionados em 3820 (três mil oitocentos e vinte) unidades, conforme descrito nos laudos prévio e definitivo de entorpecente acostados aos indexes 45950929 e 45950931. Conduzido à 2ª Delegacia da PRF, foram solicitadas ao apelante a documentação do automóvel e a sua CNH, ao que respondeu não possuir o documento do carro. Realizadas as consultas da praxe, constatou-se que a numeração do chassi não conferia com a numeração do motor, que o veículo ostentava placa «fria» e que sua placa original correspondia a de um veículo produto de furto (RO 042-11954/2022). Em conversa informal, o recorrente informou que estava levando as drogas da Rocinha para a cidade de São Pedro da Aldeia, na região dos Lagos. Ainda que o recurso não fustigue a condenação, vê-se que o tipo penal previsto no caput, da Lei 11.343/06, art. 33, é crime de natureza múltipla (multinuclear), de sorte que a prática de qualquer uma das condutas descritas no preceito primário da norma caracteriza o tráfico de drogas. A variedade e a expressiva quantidade de drogas arrecadadas, embarcadas em um veículo produto de crime anterior, associada às demais circunstâncias do flagrante, havido por força da desobediência à ordem de parada e imediata fuga seguida de perseguição, corroborada, ainda, pelos depoimentos das testemunhas policiais, confirmam que o recorrente praticava o delito previsto na Lei 11.343/06, art. 33, caput. Mais ainda, tais circunstâncias, além da própria FAC que o aponta reincidente, demonstram que o apelante não é um mero neófito na prática de atividades criminosas, mas, sim, um elemento que, por razões desconhecidas fez por merecer a confiança do mundo do crime, de modo a que lhe fosse confiada tão valiosa carga ilícita para um transporte intermunicipal. O juízo de valor se dá, portanto, ao esteio da comprovação da materialidade e autoria, corroboradas pela prova documental e testemunhal coligida. Inquestionável a responsabilidade penal pelo crime de receptação, eis que o apelante foi flagrado na posse de um automóvel produto de crime anterior (laudo de exame de clonagem no index 48230960), com placa de identificação diversa da original e, portanto, sem a documentação de porte obrigatório. Tais circunstâncias do caso concreto permitem a conclusão de que o recorrente tinha pleno conhecimento da origem ilícita do veículo, recebido das mãos de traficantes da Rocinha, sem qualquer documentação e com o porta-malas abarrotado de drogas. Escorreitas as condenações. No que concerne ao reconhecimento do privilégio no tráfico, como aqui já referido, os autos demonstram a dedicação às atividades criminosas. A FAC do index 72270709, esclarecida no index 72288122, aponta que o apelante possui uma condenação transitada em julgado em 09/08/2017, processo 25864-04.2015.8.19.0004, consubstanciando o óbice expresso previsto pelo legislador penal especial. No plano da dosimetria a sentença desafia reparos. Na primeira fase, o sentenciante utilizou a diferença entre a pena mínima e máxima cominada e dividiu por 08 (oito), que seria o número de circunstâncias judiciais previstas no CP, art. 59. Tal conta, resultou em 15 (quinze) meses por circunstância judicial. Contudo, em razão da quantidade de droga ser circunstância preponderante, aumentou a pena base ao patamar de 20 (vinte) meses para cada circunstância. Com base nisto, valorada negativamente a quantidade da droga, fixou a pena-base em 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa. Com efeito, ex vi da Lei 11.343/06, art. 42, não há nada que em que se possa embasar demérito à conduta ou personalidade do apelante. Contudo, a diversidade e a elevada quantidade de drogas permitem o exaspero, que deverá ultrapassar a fração mínima para aquietar-se em 1/5, conduzindo a inicial a 06 anos de reclusão e 600 dias-multa, suficientes à retribuição das circunstâncias valoradas. Na intermediária, a já apontada agravante da reincidência deve ser compensada com a atenuante da confissão, repetindo-se o quantitativo inicial como a pena média e aí se estabilizando a reprimenda, ausentes causas de aumento ou diminuição. Para o delito de receptação, o aumento na primeira fase não encontra arrimo na justificativa empregada, devendo a pena inicial retornar ao piso da lei, 01 ano de reclusão e 10 DM, sofrendo o acréscimo de 1/6 na intermediária pela reincidência, carreando a pena média a 01 ano e 02 meses de reclusão e 11 dias-multa, onde se aquieta à míngua de outras moduladoras. Concurso material de tipos penais, CP, art. 69, e a sanção final do apelante será de 07 (sete) anos e 02 (dois) meses de reclusão e 611 (seiscentos e onze) dias-multa. Mantido o regime inicial fechado aplicado, em se tratando de reincidente condenado à pena de reclusão superior a quatro anos, mormente em razão de que o lapso temporal havido desde a Audiência de Custódia realizada em 15/02/2023 - com a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva (index 46201905) -, até a data da prolação da sentença (15/02/2024), faz com que eventual detração seja desinfluente à modificação do regime aplicado. Impossível a substituição do art. 44 ou mesmo o «sursis» do art. 77, ambos do CP, em razão da preclara superação das quantidades de pena limites à aquisição de tais benefícios. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, na forma do voto do Relator.

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