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DOC. 142.9728.9459.3959

TJRJ. APELAÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. LESÃO CORPORAL E AMEAÇA (ART. 129, §13º E 147, AMBOS DO CP). RECURSO DEFENSIVO QUE PUGNA PELA ABSOLVIÇÃO, EM FACE DA ATIPICIDIADE DAS CONDUTAS OU DA FRAGILIDADE PROBATÓRIA E, SUBSIDIARIAMENTE, REFORMA DA DOSIMETRIA PARA FIXAR AS PENAS-BASE NOS MÍNIMOS LEGAIS, O AFASTAMENTO DA AGRAVANTE PREVISTA NO art. 61, II, «F» DO CP E A FIXAÇÃO DA FRAÇÃO DE REDUÇÃO DA PENA PELO RECONHECIMENTO DA TENTATIVA EM RELAÇÃO AO DELITO DE LESÃO CORPORAL NO PATAMAR MÁXIMO DE 2/3.

Emerge dos autos que o recorrente chegou em casa embriagado e, ao avistar a vítima Ana Carolina, sua ex-namorada, sentada no portão, tentou chutá-la, sem obter êxito. A filha da ofendida, Lorena, interferiu e empurrou o apelante. Durante a confusão, o denunciado ameaçava a vítima Ana Carolina, afirmando que a mataria. O recorrente também ameaçou Lorena, afirmando que, caso ela se intrometesse no relacionamento deles, «apanharia igual". Policiais Militares acionados por Maré Zero compareceram ao local e, mesmo na presença dos agentes, o recorrente continuou a ameaçar a vítima Ana Carolina, ao afirmar que a mataria. A materialidade e autoria estão comprovadas pelo Registro de Ocorrência de pasta 07, pelo auto de prisão em flagrante de pasta 22 e pelos depoimentos prestados em sede policial e em juízo. Como se vê, a vítima foi firme e segura ao relatar a ameaça e a tentativa agressão sofrida por seu ex-namorado e sua narrativa foi corroborada pelos demais elementos de prova, notadamente o depoimento da testemunha Lorena da Silva ouvida em juízo. Vale ressaltar que em crimes de violência doméstica, a palavra da vítima assume particular relevância, especialmente quando se apresenta lógica e coerente, uma vez ter sido esta quem vivenciou as emoções e traumas do cenário delitivo. A vítima, em juízo relatou que, no dia dos fatos, tinha acabado de chegar do trabalho quando o recorrente tentou atingi-la com um chute, sem impedido pela filha Lorena. Além disso, esclareceu que o recorrente disse iria mata-la, além de também ameaçar sua filha Lorena dizendo que se ela se intrometesse iria apanhar. No mesmo sentido do depoimento prestado Lorena que confirmou que o recorrente tentou desferir um chute em sua mãe, momento em que o impediu, empurrando-o. Nesse momento o apelante lhe ameaçou dizendo que caso se intrometesse iria apanhar. Também relatou que o recorrente disse que iria matar sua mãe, ainda tendo medo do apelante. As declarações das vítimas se mostram uníssonas entre si e sem qualquer contradição que as desmereçam, deixando claro as a tentativa de lesão corporal e as ameaças proferidas pelo recorrente, inclusive na frente de Policiais Militares, restando devidamente comprovadas. Destaca-se que, ao contrário do sustentado pela Defesa, os atos de execução no crime de lesão corporal tiveram início, somente não se consolidando em razão da rápida intervenção da filha da vítima, não havendo que se falar em atipicidade da conduta. Da mesma forma, não há como se encaixar a tese de atipicidade com a alegação de embriaguez, já que a embriaguez, voluntária ou culposa, não é capaz de afastar a imputabilidade penal (CP, art. 28, II). Assim, o seguro arcabouço probatório produzido revela-se plenamente apto a ensejar um juízo de condenação, que deve ser mantido em relação aos crimes previstos no art. 129, §13, na forma do art. 14, II, e do art. 147, por duas vezes, na forma do art. 69, tudo na forma do art. 69, todos do CP, com incidência da Lei 11.340/06. Descabida a alegação defensiva de que a aplicação da agravante descrita no CP, art. 61, II, «f», representaria bis in idem, ao argumento de que a condição de gênero da vítima já teria sido considerada pela aplicação da Lei Maria da Penha, mais gravosa ao réu. Ora, se a infração foi cometida em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, porque o agente foi companheiro da vítima, incide a referida agravante genérica. Com efeito, a mencionada agravante não se confunde com eventuais restrições impostas pelo legislador em função da natureza do crime. A ocorrência de bis in idem se daria se um mesmo fato fosse considerado mais de uma vez na dosimetria de um mesmo delito, o que não ocorreu na espécie. Trata-se de normas que trazem consequências jurídicas distintas aos crimes praticados em contexto de violência doméstica. No que diz respeito à resposta penal, passa-se à análise da dosimetria da pena. - Do crime de lesão corporal: Na 1ª fase dosimétrica, o sentenciante fixou a pena-base corretamente acima do mínimo legal em 1(um) ano e 2 (dois) meses de reclusão, em razão da presença de maus antecedentes. Na 2ª fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Presente a agravante de reincidência, com acertada fixação a fração de aumento em 1/6 (um sexto), ao patamar intermediário de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Na 3ª fase, ausentes causas de aumento de pena. Caracterizada a tentativa, a defesa impugna a fração de diminuição da pena. Contudo, conforme se observa dos depoimentos das vítimas o iter criminis foi percorrido de forma suficiente a justificar o redutor pela metade, o que justifica a imposição da pena em 08 (oito) meses e 05 (cinco) dias de reclusão. - Crime de ameaça - vítima Ana Carolina: Na 1ª fase dosimétrica, o sentenciante fixou a pena-base corretamente acima do mínimo legal, em razão da presença de maus antecedentes, ao patamar de 1 (um) mês e 5 (cinco) dias de detenção. Na 2ª fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Configurada a reincidência e agravante CP, art. 61, II, f, com acertada fixação a fração de aumento em 1/5 (um quinto), ao patamar intermediário de 1 (um) mês e 12 (doze) dias de detenção. Na 3ª fase, ausentes causas de aumento ou de diminuição, a pena se estabiliza em 1 (um) mês e 12 (doze) dias de detenção. - Crime de ameaça - vítima Lorena: Na 1ª fase dosimétrica, o sentenciante fixou a pena-base acima do mínimo legal em razão da presença de maus antecedentes, além de considerar que a vítima ficou extremamente abalada psicologicamente. As consequências do crime, descritas na sentença, todavia, não têm qualquer sustentação probatória. As declarações prestadas pelas testemunhas, ouvidas sob o crivo do contraditório, não indicam que a vítima tenham ficado traumatizada e nem que teria sofrido danos psicológicos. Em razão disso, se acolhe o pleito defensivo para se decotar o incremento de pena imposto pela sentença em decorrência das consequências do crime, estabilizando a pena-base no patamar de 1 (um) mês e 5 (cinco) dias de detenção. Na 2ª fase, ausentes circunstâncias atenuantes. Configurada a reincidência e agravante CP, art. 61, II, f, com acertada fixação a fração de aumento em 1/5 (um quinto), ao patamar intermediário de 1 (um) mês e 12 (doze) dias de detenção. Na 3ª fase, ausentes causas de aumento ou de diminuição, a pena se estabiliza em 1 (um) mês e 12 (doze) dias de detenção. - Do concurso material: Com a soma das penas a reprimenda final atinge o patamar de 08 (oito) meses e 05 (cinco) dias de reclusão e 2 (dois) meses e 24 (vinte e quatro) dias de detenção. O regime semiaberto também se mostra compatível com a pena aplicada e reincidência, em acordo com o disposto no art. 33, §2º, «c», do CP. Impossível a substituição das penas privativas de liberdade por restritivas de direitos em razão dos crimes terem sido praticados com violência ou grave ameaça às vítimas e a reincidência, encontrando obste na regra prevista no art. 44, I e II do CP. Deixo de aplicar o sursis, pois a reincidência não o autoriza, nos termos do art. 77, I do CP. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

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