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DOC. 146.2997.5623.2382

TST. I - ESCLARECIMENTO INICIAL

Em razão de recurso extraordinário interposto pela RUMO MALHA SUL S/A. retornam os autos da Vice-Presidência do TST para exame de eventual juízo de retratação quanto ao agravo de instrumento da empresa, ante ao que foi decidido pelo STF no julgamento do ARE 1.121.633 (Tema 1.046) e do RE 1.476.596 . II - AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECLAMADA. ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017 RECLAMANTE CONTRATADO COMO OPERADOR DE PRODUÇÃO. CONTRATO DE TRABALHO EXTINTO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017 NORMA COLETIVA QUE PREVÊ A JORNADA DE OITO HORAS EM TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO DESCUMPRIMENTO DO PACTUADO ANTE A PRESTAÇÃO HABITUAL DE HORAS EXTRAS ALÉM DA OITAVA DIÁRIA 1 - Em acórdão anterior, a Sexta Turma negou provimento ao agravo de instrumento da reclamada para manter a ordem denegatória do recurso de revista da empresa, considerando que o TRT decidiu com acerto ao deferir o pagamento das horas excedentes à 6ª diária e 36ª semanal. Ficou consignado que « o CF/88, art. 7º, XIV fixa jornada de seis horas para o trabalho prestado em turnos ininterruptos de revezamento, permitindo, entretanto, que a empresa estabeleça jornada superior a seis horas mediante negociação coletiva, que tem força de lei, e deve por isso ser respeitada, conforme o disposto no CF/88, art. 7º, XXVI. O que o legislador constituinte objetivou foi a busca de condições mais benéficas para o trabalhador. No entanto, o elastecimento da jornada em turnos ininterruptos de revezamento, mediante negociação coletiva, é limitado a oito horas, nos termos da Súmula 423/TST [...] Infere-se dos dispositivos constitucionais, assim como da referida súmula, que a negociação coletiva que permite a extrapolação da jornada de 6 horas dos empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento é uma excepcionalidade, e o limite de horas ali imposto deve ser obedecido, sob pena de se desvirtuar o objetivo do legislador, qual seja, minimizar os desgastes sofridos por esses empregados «. 2 - O Supremo Tribunal Federal, em acórdão proferido nos autos do ARE Acórdão/STF, publicado em 28/4/2023, firmou a seguinte tese, em repercussão geral: « São constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". 3 - O STF considerou que são constitucionais as matérias que envolvem a flexibilização de direitos trabalhistas por norma coletiva, superando o entendimento de que teria natureza infraconstitucional a controvérsia sobre a norma coletiva que trata da redução do intervalo intrajornada e da majoração da jornada em turnos ininterruptos de revezamento (Tema 357) e a norma coletiva que trata da redução do pagamento das horas in itinere a tempo menor que metade do tempo gasto (Tema 762). 4 - Segundo a fundamentação assentada no voto do Ministro Gilmar Mendes, relator no Tema 1.046, « admite-se que acordo ou convenção coletiva de trabalho estabeleça fórmulas de compensação de jornada"; «Tais compensações, no entanto, devem respeitar balizas fixadas pela legislação e pela própria jurisprudência trabalhista «. 5 - As normas constitucionais sobre jornadas são de indisponibilidade relativa, e não de disponibilidade total. Ou seja, a norma coletiva não pode tudo. A norma coletiva pode reduzir a jornada ou prorrogar a jornada mediante compensação desde que observe o patamar civilizatório. A CF/88 não autorizou a norma coletiva a estabelecer jornada máxima de trabalho, mas sim a disciplinar as hipóteses de prorrogação para o fim de compensação (art. 7º, XIII e XIV, da CF/88). A norma coletiva não pode se sobrepor ao legislador constituinte originário quanto à jornada máxima. Se assim fosse, estaria aberta a porta para a volta aos patamares da Revolução Industrial com trabalhadores ordinariamente cumprindo jornadas de 14h, 16h, 18h e até 22h. Não se pode perder de vista que a fixação de jornada máxima resulta da evolução civilizatória que compreende o trabalhador em sua dimensão psicobiofísica e em seu status de sujeito de direitos originados do princípio da dignidade da pessoa humana, entendido na teoria constitucional como regra matriz dos direitos trabalhistas. O ser humano é o centro, da CF/88 - e aos trabalhadores foram assegurados direitos fundamentais ao longo do CF/88, art. 7ºe outros dispositivos, da CF/88. 6 - A previsão do art. 7º, XIV, da CF/88(jornada normal de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva) levou em conta a situação especial dos trabalhadores submetidos a esse tipo de jornada. No regime de turnos ininterruptos de revezamento os empregados trabalham em turnos contínuos (no sentido de que uma turma sucede a outra no posto de trabalho). Os turnos podem ser fixos ou alternados. Os turnos podem abranger manhã, tarde e/ou noite. No caso de turnos alternados há variações diversas - semanais, quinzenais, mensais etc. Historicamente, a Lei 5.811/1972 havia previsto o regime de revezamento de oito horas e, em casos excepcionais, de doze horas, para os empregados nas atividades de exploração, perfuração, produção e refinação de petróleo, industrialização do xisto, indústria petroquímica e transporte de petróleo e seus derivados por meio de dutos. Porém, o regime de revezamento passou a ser aplicado em outras atividades profissionais. A experiência demonstrou que os trabalhadores em turnos ininterruptos de revezamento estão sujeitos a uma rotina desgastante que pode prejudicar o relógio biológico e afetar sua saúde física e mental. Além disso, para os trabalhadores que se alternam em turnos distintos que abrangem o dia e/ou a noite, por exemplo, pode ficar comprometida a rotina familiar, pessoal e/ou social e até mesmo a chance de estudar ou frequentar cursos que tenham horários fixos. Enfim, são várias as razões relevantes que levaram o legislador constituinte originário a fixar, como regra, a jornada máxima de seis horas diárias. 7 - Daí, no plano jurisprudencial, a Súmula 423/TST: « estabelecida jornada superior a seis horas e limitada a oito horas por meio de regular negociação coletiva, os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não têm direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas como extras «. 8 - A limitação da sobrejornada a no máximo duas horas diárias em regime de compensação no caso de turnos ininterruptos de revezamento observa a simetria com o art. 7º, XIII, da CF/88(que fixa a jornada máxima diária de oito horas para as categorias profissionais em geral) e a simetria com a hipótese do CLT, art. 59 (que admite a sobrejornada de no máximo duas horas diárias quando se trata de horas extras). 9 - É válida a norma coletiva que prevê a jornada de oito horas em turnos ininterruptos de revezamento mediante a compensação de jornada. Porém, quando não há nenhuma compensação ou quando a compensação é parcial, a própria norma coletiva é descumprida. Situação mais grave ainda acontece quando, além de não compensada a sobrejornada destinada à compensação, são acrescidas horas extras habituais. 10 - No caso, é incontroversa a existência de norma coletiva que fixou a jornada de 8 horas diárias para os empregados que laboram em turnos ininterruptos de revezamento. Da delimitação do trecho do acórdão transcrito no recurso de revista da reclamada, extrai-se que o TRT reconheceu que « é possível o elastecimento a jornada dos trabalhadores submetidos a turnos ininterruptos de revezamento, mediante negociação coletiva «, ante o disposto no CF/88, art. 7º, XIV c/c Súmula 423/STJ, mas apontou que, « para que seja válido o elastecimento da jornada dos empregados submetidos ao regime de turnos ininterruptos de revezamento, não é possível que sejam submetidos à prorrogação de horários «, como ocorreu no caso concreto em que « havia labor além da 8ª diária de forma habitual, conforme se observa nos cartões-ponto «. Nesse contexto, a Turma julgadora concluiu que a prestação habitual de horas extras « torna inválido o elastecimento da jornada em turnos ininterruptos, ainda que prevista em norma coletiva, pois é incompatível com a garantia constitucional de manutenção de sua higidez física e mental, insculpida no art. 6º e 7º, XXII, da CF/88 e conforme OJ-SDI1-274 do TST «. 11 - Bem examinando os fundamentos adotados pelo TRT, verifica-se que, na realidade, não foi propriamente declarada a invalidade da norma coletiva que elasteceu a jornada em turno ininterrupto de revezamento para 8 horas diárias, a qual permanece válida para a categoria profissional quando for regularmente cumprida. O que se concluiu é que não é viável o enquadramento do caso concreto na previsão da norma coletiva porque ela própria não foi observada. Logo, como não havia o cumprimento da jornada prevista na norma coletiva, afasta-se a sua aplicação nesta lide, devendo ser reconhecido o direito ao pagamento das horas extras após a sexta diária e a trigésima sexta semanal, conforme decidiu o TRT. 12 - Sinale-se que o caso examinado pelo STF no RE 1.476.596 (processo representativo da Controvérsia 50014 do TST - AIRR-12111-64.2016.5.03.0028) se distingue do que está sob exame, pois naquele caso efetivamente foi declarada a invalidade da norma coletiva, que estabeleceu jornada em turno ininterrupto de revezamento superior a 8h diárias para compensação aos sábados. 13 - Nesse contexto, tem-se que o acórdão da Sexta Turma não contraria a tese vinculante do STF. 14 - Juízo de retratação não exercido, com devolução dos autos à Vice-Presidência do TST.

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