TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO. art. 155, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA DE ABSOLVIÇÃO COM BASE NO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PUGNANDO PELA CONDENAÇÃO, NOS TERMOS DA DENÚNCIA.
A exordial acusatória narra que no dia 10/03/2023, por volta das 09:30h, no interior do supermercado Mundial, situado na Rua Siqueira Campos, 71, Copacabana, a denunciada, consciente e voluntariamente, subtraiu 24 unidades de diversos produtos, dentre produtos alimentícios e de higiene, perfazendo o valor total de R$ 198,56 (cento e noventa e oito reais e cinquenta e seis centavos), pertencentes ao estabelecimento comercial mencionado. Na data dos fatos, a denunciada se dirigiu ao citado supermercado, colocou diversos produtos em uma sacola e deixou o local sem efetuar o pagamento. Conforme a exordial, após a subtração, a denunciada foi detida pelo fiscal do estabelecimento, que já a conhecia por ser autora de outros furtos no local, na posse dos bens subtraídos. O funcionário Alex de Oliveira Barbosa conteve a apelante e os policiais civis acionados compareceram ao local, onde, ao chegarem, foram informados pelos fatos pelo funcionário do estabelecimento. Configurado o estado flagrancial, a acusada foi encaminhada à delegacia onde foi lavrado o auto de prisão em flagrante e adotadas as providências cabíveis. Em audiência de custódia, foi concedida liberdade provisória à acusada. Integram o caderno probatório o registro de ocorrência 012-02781/2023 (id. 48949867), o auto de prisão em flagrante (id. 48949866), a nota fiscal cancelada (id. 48949882), os termos de declaração (ids. 48949873, 48949870, 48949871), o auto de apreensão e entrega (id. 48949868), e a prova em audiência, colhida sob o crivo do contraditório. Em audiência de instrução e julgamento, a vítima e o policial civil corroboraram os fatos relatados na inicial acusatória. A ré, em que pese ter sido intimada para o ato, não compareceu à audiência, razão pela qual fora decretada a sua revelia. Postos tais marcos, importante ressaltar que o princípio da insignificância, embora não tenha previsão no ordenamento jurídico pátrio, é admitido dentro das balizas fixadas pelos operadores do direito. Sua aplicação se sustenta na mínima intervenção do Estado em matéria penal e resulta no afastamento da tipicidade material da conduta. A orientação dos Tribunais Superiores alinha-se no sentido de que, para a verificação da lesividade mínima da conduta, apta a torná-la atípica, deve-se levar em consideração os seguintes vetores: a) a mínima ofensividade da conduta do agente; b) a ausência de periculosidade social da ação; c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada, salientando que o Direito Penal não se deve ocupar de condutas que, diante do desvalor do resultado produzido, não representem prejuízo relevante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. No caso dos autos, os bens foram furtados de um supermercado e se referem a produtos de higiene e alimentação, perfazendo o total de R$ 198,56 (cento e noventa e oito reais e cinquenta e seis centavos e foram devolvidos ao estabelecimento comercial, não se observando a tipicidade material da conduta perpetrada pela apelada. Em que pese o órgão ministerial entender que «A permissividade estatal em relação a condutas dessa natureza, em verdade, configuraria a institucionalização de um padrão de comportamento extremamente perigoso, capaz de gerar profunda insegurança e reprovação no meio social.», e que o requisito da inexpressividade da lesão jurídica não foi atendido, os bens foram furtados por uma idosa de 78 anos e, frise-se, se referem a produtos de natureza alimentar e de higiene pessoal, e consoante se verifica na FAC da apelada, há somente uma anotação referente a este processo (id. 100148029). Conquanto prepondere o entendimento para o STJ de que se considera irrisório o valor da res furtivae quando não ultrapassa o percentual de 10% (dez por cento) do salário mínimo vigente à época dos fatos, na presente hipótese, considerando as circunstâncias concretas, excepcionalmente este patamar deve ser mitigado. Precedentes. Assim, a subversão de valores aconteceria se a máquina judicial fosse movimentada e uma pena fosse aplicada à pessoa idosa e primária, que subtraiu produtos de natureza alimentar e de higiene, sendo certo que o proprietário conseguiu reaver os produtos subtraídos. Não verificada efetiva lesão ao patrimônio da empresa e nem à ordem jurídica e social, a absolvição deve subsistir. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
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