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DOC. 461.0817.6219.6481

TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE LESÃO CORPORAL COMETIDO NO ÂMBITO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. RECURSO DEFENSIVO. ABSOLVIÇÃO PELA FRAGILIDADE PROBATÓRIA OU PELA LEGÍTIMA DEFESA. DESCABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. REPARO NA DOSIMETRIA. SURSIS QUE SE CONCEDE. ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL. 1)

Emerge firme dos autos que o acusado ofendeu a integridade física da vítima, sua companheira, ao lhe desferir tapas, socos e uma tentativa de esganadura. Consta que a vítima estava dormindo no apartamento em que residia com o acusado, quando este adentrou no imóvel pulando a sacada, e, em seguida, ao ler no aparelho celular da ofendida uma mensagem, passou a agredi-la, tendo quebrado inclusive uma janela do apartamento. Ato contínuo, a vítima correu até a guarita da portaria e se trancou em um banheiro, sendo, contudo, seguida por Hiago. Não satisfeito, o acusado arrombou a porta do banheiro e agrediu novamente a ofendida com socos na cabeça. 2) Materialidade e autoria devidamente comprovadas, à luz de todo conjunto probatório carreado nos autos, com base na prova oral produzida em juízo e nos demais elementos do inquérito policial. Nos crimes praticados no âmbito doméstico, cometidos geralmente longe de terceiros, a palavra da vítima assume grande relevo probatório, e uma vez prestada de maneira segura e coerente, como no caso, mostra-se decisiva para a condenação. Precedentes. 3) Relato da vítima em consonância com o laudo de exame de corpo de delito, conclusivo no sentido de que a vítima apresentava equimose violácea na região posterior do antebraço esquerdo; equimose violácea na região frontal média, com edema local; presença de tumoração por edema em região masseterina direita, sua porção pré auricular, compatível com o evento narrado e produzido por ação contundente. 3) Tampouco merece agasalho a arguição de exclusão de antijuridicidade da conduta, que teria sido praticada em legítima defesa, uma vez que o laudo de exame de corpo delito de lesão corporal acostado aos autos revela que a vítima sofreu as lesões, o que denota que o condenado, ainda que se pudesse admitir que não tenha dado início às agressões, não se limitou a estancá-las. Seu comportamento não foi de defesa, mas revide, atuando em nítido excesso doloso. Ora, a legítima defesa ocorre quando da utilização de meios moderados e necessários para fazer cessar injusta agressão, limite este, à toda evidência, ultrapassado pelo Apelante. 4) Noutro giro, com o advento da Lei 14.188/21, foi incluída a qualificadora do §13 ao CP, art. 129 nas hipóteses em que a lesão for praticada contra mulher, por razões da condição do sexo feminino, resultando uma pena de 01 (um) a 04 (quatro) anos de reclusão. No presente caso, o contexto em que se deram as agressões praticadas pelo réu demonstra que a violência sofrida pela vítima foi em razão do gênero, haja vista a relação entre as partes e a condição de vulnerabilidade da ofendida, o que caracteriza a violência definida no §13 do CP, art. 129, sendo inviável o acolhimento do pleito desclassificatório para a conduta prevista no art. 129, § 9º, do mesmo diploma legal. 5) Dosimetria. 5.1) Pena-base. Inexistem provas nos autos de que a filha da vítima tenha presenciado as agressões, embora haja menção de que a criança se encontrava no interior do imóvel no qual as agressões começaram. Não obstante, a pena-base foi corretamente estabelecida acima do mínimo legal, em razão da maior reprovabilidade da conduta do acusado, tendo em vista que as agressões ocorreram durante a madrugada, surpreendendo a vítima em momento de repouso noturno, prosseguindo com as agressões até a portaria do condomínio, não se intimidando nem com esse cenário, atraindo a presença de várias pessoas ao local. Da mesma forma, encontra-se plenamente justificado o recrudescimento operado na pena-base, como resultado da humilhação sofrida pela vítima, vez que o ferimento foi produzido em seu rosto, acarretando maior constrangimento em aparecer em público. Precedente. 5.2) Por outro lado, como é cediço, uma vez reconhecida duas circunstâncias judiciais, não há obrigatoriedade na aplicação do patamar de 1/8 para cada fator desfavorável, como pretende a defesa, motivo pelo qual se aplica a fração usual de aumento de 1/6 para cada vetorial negativa, nos termos jurisprudenciais (STJ, 607497, AgRg no HC, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, julgamento 22/09/2020). 4.2) Não há que se falar em incidência da atenuante da confissão espontânea, uma vez que o réu não confessou os fatos, aduzindo que agira em legítima defesa. 4.3) Inviável a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no § 4º, do CP, art. 129, pois a afirmação do acusado, no sentido de que foi agredido antes pela vítima, encontra-se isolada dos demais elementos probatórios, especialmente pelo seguro relato da vítima, ao afirmar que o acusado deu início às agressões físicas. 5) Na fase derradeira, não se verifica a presença de causas de aumento e diminuição de pena, pelo que deve a sanção ser mantida no patamar de 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão. 6) Concessão do Sursis que se impõe, dado que a pena definitiva não supera dois anos e o réu é primário, o que se faz pelo prazo de 02 anos, na forma do art. 77 e 78 do CP, mediante o cumprimento das condições previstas no art. 78, §2º, s ¿a¿, ¿b¿ e ¿c¿ do Código Repressivo. 7) Regime que se abranda para o aberto para hipótese de conversão à luz do disposto no art. 33, §2º, ¿c¿, do CP. Parcial provimento do recurso defensivo.

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