TJRJ. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ART. 129, § 9º E ART. 140, AMBOS DO CP.
Cinge-se a questão em definir o juízo competente para processar procedimento que versa sobre infrações penais previstas nos arts. 129, § 9º e 140, ambos do CP, praticadas, em tese, pela madrasta do companheiro da vítima e sua filha. Segundo consta das declarações da suposta vítima, a madrasta de seu companheiro e a filha da mesma foram até sua residência e a agrediram por meio de socos, tapas e puxões de cabelo, além de injuriá-la, chamando-a de «piranha» e «chifruda". O feito foi distribuído inicialmente para o Juízo do IV Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Bangu, que declinou de sua competência para uma das varas criminais da regional. Os autos foram distribuídos ao Juízo da 2ª Vara Criminal de Bangu, que suscitou o presente conflito. Desassiste razão ao juízo suscitante. É certo que a Lei 14.550/2023 acrescentou o art. 40-A na Lei 11.340/2006, dispondo que a Lei Maria da Penha «será aplicada a todas as situações previstas no seu art. 5º, independentemente da causa ou da motivação dos atos de violência e da condição do ofensor ou da ofendida". Com efeito, quis o legislador afastar a interpretação restritiva que exigia a verificação de gênero em relação à violência praticada contra a mulher. Ocorre que, na hipótese em tela, ainda que excluída a questão relativa ao gênero, não se percebe nenhuma situação de vulnerabilidade da suposta vítima em relação às interessadas. Consoante dispõe a Lei 11.340/2006, art. 5º, «configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial". Evitar comportamentos de opressão à mulher, em razão da condição de sexo feminino, é o que dá fundamento à aplicação da Lei Maria da Penha. Pensar diferente seria banalizar a lei especial, admitindo sua incidência em qualquer infração cometida contra vítima do sexo feminino, sem análise da existência de vulnerabilidade e de opressão por sua condição de mulher. No mesmo sentido é o enunciado do Fórum Fluminense de Violência Doméstica (FOVID), aprovado em 01/09/2023, que dispõe que «A redação do Lei 11340/2006, art. 40-A, incluído pela Lei 14.550/23, não afasta a necessidade de avaliação no caso concreto se o fato ocorreu em razão do gênero da vítima". A Lei de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher é especial e, portanto, sua aplicação só se justifica quando verificada situação cujo suporte fático evidencie concretamente a necessidade de uma maior proteção à mulher, o que não é o caso dos presentes autos. Ao que parece, os fatos ocorreram em razão de uma desavença familiar entre três mulheres, não se vislumbrando situação de hipossuficiência a ensejar a aplicação da lei especial. Desse modo, a competência para julgamento é do juízo suscitante, qual seja, da 2ª Vara Criminal da Regional de Bangu. CONFLITO DE COMPETÊNCIA CONHECIDO E JULGADO IMPROCEDENTE.
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