TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO PELOS CRIMES DOS arts. 217-A, N/F DO art. 71, AMBOS DO CP - PRÁTICA DE ATOS LIBIDINOSOS DIVERSOS DA CONJUNÇÃO CARNAL - CONTRA VÍTIMA DE APENAS 09 (NOVE) ANOS DE IDADE À ÉPOCA EM QUE SE INICIARAM OS FATOS, OS QUAIS PERDURARAM ATÉ OS 12 ANOS DE IDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA E REGIME PRISIONAL MAIS SEVERO QUE NÃO DESAFIAM AJUSTES. 1)
Emerge dos relatos, seguros, contundentes e detalhados, prestados pelas testemunhas/informantes e confirmados pela vítima Ana Júlia - com apenas 9 anos de idade à época em que se iniciaram os fatos, os quais perduraram até os 12 anos de idade -, em todas as fases da persecução penal, que o acusado, prevalecendo-se das relações de parentesco, hospitalidade e confiança entre a vítima e seus familiares, notadamente por ser avô paterno da vítima, e por recebê-la em sua casa, quando ela ficava aos cuidados da avó - que saía muito cedo para ir à Igreja -, e aproveitando que ficava sozinho com a vítima, passava as mãos no corpo da criança e acariciava a genitália dela, tudo com o intuito de satisfazer a sua lascívia. 2) Materialidade e autoria dos delitos comprovadas, na prova oral colhida em sede policial e confirmada sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. Relevante valor probatório atribuído à palavra da vítima nos crimes sexuais, porquanto tais delitos ocorrem geralmente às escondidas e não deixam vestígios materiais. Versão acusatória corroborada pelas declarações das testemunhas/informantes. Acervo probatório produzido nos autos a evidenciar as imputações atribuídas ao apelante. Precedentes. 2.1) Destaque-se aqui, que não se constata a existência de contradições de valor nas declarações da vítima prestadas em sede policial e em Juízo, nos moldes consignados pela defesa em sede de apelo, buscando retirar a sua credibilidade, uma vez que em todas as fases da persecução penal, a vítima foi clara ao afirmar que o acusado, aproveitando-se dos momentos em que ficava com ela sozinha, alisava o corpo da vítima, e ainda a ameaçava dizendo que se ela contasse para algum adulto, ele sumiria com sua avó e suas tias. 2.2) Aqui vale obtemperar que o profissional que procedeu à oitiva da vítima em sede policial (fls.42/44), foi categórico ao concluir que ¿As declarações de ANA JULIA, NÃO demonstram contradições relevantes OU indícios de terem sido contaminadas (sugestionadas ) por outra pessoas, indicando veracidade em relação ao fatos vivenciados pelo mesmo e aqui abordados, onde CONCLUO haver a possibilidade de ter ela sofrido abuso sexual através dos atos libidinosos¿. 2.3) Registre-se, ainda, como destacado pelo sentenciante, que ¿Ana Julia começou a se machucar, não querer ir para o colégio, se isolava muito, apesar de ser uma criança alegre e carinhosa anteriormente, enfim, concluiu que ela mudou bastante, o que corrobora a narrativa da infante no sentido da prática dos atos libidinosos descritos na denúncia. Tais sinais, geralmente, são alertas que as crianças e adolescentes emitem quando estão sofrendo algum tipo de abuso sexual¿, e ¿quando inquirida perante o NUDECA, Ana Julia apresentou depoimento emocionado, vindo às lágrimas conforme narrava os abusos cometido¿. 2.4) Outrossim, observa-se que os crimes contra os costumes muito raramente contam com testemunhas presenciais, pois geralmente ocorrem na clandestinidade, como na espécie. 2.5) E vale registrar que a jurisprudência pacificada no STJ é no sentido de que ¿o delito de estupro, na atual redação dada pela Lei 12.015/2009, inclui atos libidinosos praticados de diversas formas, incluindo os toques, os contatos voluptuosos e os beijos lascivos, consumando-se o crime com o contato físico entre o agressor e a vítima¿, exatamente como ocorreu na espécie. (REsp. 1642083, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 7/4/2017, DJe 11/4/2017). 2.6) Assim, não causa espécie o fato de o laudo de exame de corpo de delito não constatar a presença de abuso sexual contra a vítima, ou por constatar que seu hímen se encontra intacto, pois trata-se de imputação relativa à prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal, que não deixam vestígios, como é assente na Jurisprudência do STJ. Precedentes. 2.7) Nesse cenário, o acervo probatório valorado pelo sentenciante demonstra de forma contundente que o acusado praticou os crimes de estupro de vulnerável contra a vítima Ana Júlia ¿ passar as mãos no corpo da vítima, inclusive por dentro da calcinha, ficar em cima da vítima -, tudo com o intuito de satisfazer a sua lascívia, pelo período de 03 anos. 3) Dosimetria. 3.1) Pena-Base. No que tange à dosimetria do crime de estupro de vulnerável, que foi estabelecida em atenção ao sistema trifásico, tem-se por manter a majoração escorada nas circunstâncias e consequências do crime ¿ ¿(i) conforme narrado por Ana Julia, o réu a ameaçava constantemente, afirmando que, se contasse algo a alguém acerca dos abusos, mataria seus familiares, a gerar intenso temor na vítima, elementar esta não prevista no tipo penal do CP, art. 217-A (ii) conforme reiteradamente narrado pela genitora e avó da criança, Ana Júlia alterou seu comportamento em razão dos fatos narrados na exordial acusatória, passando a urinar na cama, dormir nas aulas, chorar demasiadamente, se isolar e inclusive levar uma faca para a escola para se matar, a denotar, com isso, uma experiência demasiadamente traumática que vai além da consumação do delito¿ -, pois essas situações fáticas efetivamente extrapolam as elementares do tipo penal em comento, e justificam a aplicação da fração de 1/4, nos moldes consignados pelo sentenciante. Precedentes. 3.1.1) Assim, mantem-se a pena-base do crime de estupro de vulnerável em 10 (dez) anos de reclusão, a qual se torna definitiva ante a não valoração de outras circunstâncias que tivessem o condão de alterá-la. 3.2) Quanto à continuidade delitiva, olvida a defesa que a vítima foi molestada dos 09 anos aos 12 anos de idade, ou seja, durante 3 anos, o que caracteriza a impossibilidade de se aferir, com exatidão, o número de vezes que a vítima foi molestada pelo acusado. 3.2.1) No entanto, a Jurisprudência do STJ, é uníssona em admitir a aplicação da fração máxima de aumento, considerando o longo período a que vítima foi molestada pelo acusado, o que permite concluir, no caso concreto, que houve mais de sete abusos. Precedentes. 3.1.2) Assim, preservada a fração de aumento pela continuidade delitiva em seu grau máximo (2/3), mantém-se a pena final do acusado em 16 (dezesseis) anos e 08 (oito) meses de reclusão. 4) Em razão do quantum de pena final estabelecido ¿ superior a 8 anos de reclusão -, e diante da valoração de circunstância judicial negativa, que foi causa suficiente do afastamento da pena-base do crime de estupro de seu mínimo legal, tem-se por manter o regime prisional mais gravoso (fechado) para o início do desconto da pena corporal, nos exatos termos do art. 33, §§ 2º, ¿a¿, e 3º, do CP. Desprovimento do recurso.
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