TJRJ. HABEAS CORPUS. LEI 11.343/06, art. 33. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PRISÃO PREVENTIVA. IMPETRAÇÃO QUE PLEITEIA A REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA EM RAZÃO DE: 1) AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO CPP, art. 312, NOTADAMENTE O FUMUS COMISSI DELICTI E O PERICULUM LIBERTATIS; 2) CONDIÇÕES SUBJETIVAS FAVORÁVEIS E CRIME COMETIDO SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA; 3) DESPROPORCIONALIDADE ENTRE A MEDIDA CAUTELAR APLICADA E A PENA PREVISTA EM ABSTRATO.
Os autos revelam que no dia 06/09/2024, por volta das 17h30min, policiais militares teriam avistado o paciente à beira de um valão, na altura da praça Vira Copos, bairro Parque Aeroporto, no município de Macaé. Em atitude suspeita, ao se deparar com os agentes, o paciente teria saído do local disfarçadamente, mas foi abordado pelos policiais. Durante a abordagem, os agentes da lei teriam encontrado sob uma pedra, no local em que supostamente o recorrente estava urinando, um estojo contendo cerca de 12 «mariolas» com erva seca. Os agentes também disseram que encontraram em posse do paciente um celular com R$ 50,00 (cinquenta reais) na parte traseira da capa. De acordo com o relato dos policiais, a região em que se dera o ocorrido é dominada pela facção «Comando Vermelho". O laudo de exame prévio de entorpecente indicou que a substância apreendida se tratava de 144g de Cannabis sativa L. popularmente conhecida como «maconha". Em decisão prolatada em 08/09/24, por ocasião da realização da audiência de custódia, a prisão em flagrante do paciente foi convertida em prisão preventiva. Inicialmente, cabe afirmar que as alegações relativas à ausência de prova da autoria são atinentes ao mérito da ação penal. Sua apreciação demanda maior revolvimento probatório, sendo, portanto, incabível nesta limitada ótica de cognição sumária. Quanto à decisão conversora, em uma análise perfunctória, possível em sede de habeas corpus, vê-se que está devidamente fundamentada e motivada em elementos concretos, nos termos do art. 93, IX, da CR/88 e CPP, art. 312. O fumus comissi delicti está presente, pois há indícios de autoria, decorrentes da própria situação flagrancial em que se deu a prisão. O perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado (CPP, art. 312, sob a nova redação dada pela Lei 13.964/2019) está fundado na necessidade de garantia da ordem pública, diante da necessidade de se resguardar o meio social, evitando-se que a sociedade seja novamente lesada pela mesma conduta em tese cometida. É certo que a gravidade em abstrato do crime não pode servir como fundamento para o decreto da medida extrema. Contudo, o magistrado pode se valer da narrativa em concreto dos fatos imputados para concluir sobre o risco que a liberdade do agente poderia acarretar, o que ocorreu na hipótese em tela. Na presente hipótese, a autoridade apontada como coatora destacou na decisão o relato de uma das testemunhas, que afirmou que a prisão ocorreu em local conhecido por ser dominado por facção criminosa, estando o paciente supostamente em posse de quantidade relativamente expressiva de material entorpecente, com inscrições alusivas à facção criminosa «Comando Vermelho". O fato de haver indícios de que o paciente tem ligação com a facção criminosa que exerce seu domínio sobre o local em que se deram os fatos torna aplicável na espécie o entendimento já firmado pelo Colendo Excelso Pretório, de que «a custódia cautelar visando à garantia da ordem pública legitima-se quando evidenciada a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa» (HC 118.340/SP, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJe de 23/4/16). A ordem pública também se consubstancia na necessidade de se resguardar o meio social, conforme lição de Júlio Fabbrini Mirabete e julgados do STF. Verifica-se a contemporaneidade da motivação que deu ensejo à prisão preventiva, em razão da possibilidade de reiteração delitiva, não havendo qualquer alteração no quadro fático desde então, em total consonância com o disposto no art. 315, § 1º do CPP (incluído pela Lei 13.964, de 2019). A prisão preventiva não constitui antecipação de pena, e não fere o princípio da presunção de inocência se imposta de forma fundamentada, como é o caso dos autos, em que se impõe-se uma atuação coercitiva do Estado, a fim de garantir o equilíbrio e a tranquilidade social, razão pela qual afasta-se, excepcionalmente, a intangibilidade da liberdade individual, a fim de salvaguardar interesses sociais. Lado outro, não se sustenta a tese defensiva que fundamenta a necessidade de revogação da prisão preventiva em razão da primariedade do recorrente. Isso porque, as condições subjetivas favoráveis, por si sós, não inviabilizam a constrição provisória daquele que sofre a persecução penal instaurada pelo Estado, se presentes os motivos legais autorizadores da medida extrema restritiva, como se verifica na hipótese em apreço, sendo pacífica a jurisprudência do STJ nesse sentido. De outro giro, ao que se observa, em que pese se tratar de crime cometido sem violência ou grave ameaça, a conduta imputada ao paciente se reveste de gravidade concreta suficiente para demonstrar o flagrante risco à ordem pública, tendo em vista a relevante quantidade de droga apreendida (144g de maconha) e que o suposto comércio espúrio era realizado em plena via pública, o que demonstra, em tese, ousadia e destemor por parte do agente. No tocante à alegada desproporcionalidade da prisão em cotejo com a futura pena a ser aplicada, a decretação de prisão preventiva pode ocorrer independentemente da pena abstratamente cominada, visando à efetividade da lei, exatamente o caso dos presentes autos. Ainda que assim não fosse, o argumento de ausência de homogeneidade não passa de mero exercício de futurologia, que somente será confirmado após a sentença. Outrossim, a probabilidade de incidência da forma privilegiada do delito de tráfico está condicionada à presença de requisitos que demandam o revolvimento probatório, incabível nesta limitada ótica de cognição sumária. A pena máxima cominada ao delito imputado é superior a quatro anos e, em caso de condenação, poderão ainda ser sopesadas eventuais circunstâncias negativas apuradas durante a instrução, o que lança ao desabrigo qualquer alegação de desproporcionalidade entre a prisão cautelar e aquela que surgiria em caso de condenação. Constrangimento ilegal inocorrente. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA.
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