Carregando…

DOC. 758.3278.3981.9166

TJRJ. APELAÇÃO. CP, art. 171, CAPUT. RECURSO DEFENSIVO ARGUINDO, PRELIMINARMENTE, A NULIDADE DA SENTENÇA, NO TOCANTE À CONDENAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, POR CONFIGURAR REFORMATIO IN PEJUS. NO MÉRITO, REQUER: 1) FIXAÇÃO DA PENA-BASE EM SEU PATAMAR MÍNIMO OU AINDA A REDUÇÃO DO EXASPERO REALIZADO NA SENTENÇA; 2) ABRANDAMENTO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DE PENA; 3) ISENÇÃO DO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS.

Inicialmente, ao analisar os autos, verifica-se que, em 07/10/2023, foi prolata sentença, condenando o apelante às penas de 04 anos de reclusão, no regime inicialmente fechado, e 40 dias-multa, pela violação do CP, art. 171, sem que o julgador fizesse qualquer menção à eventual condenação ao pagamento de danos materiais. A defesa interpôs recurso de apelação, que foi julgado por esta Câmara em 28/02/2024, anulando a sentença por ausência de fundamentação. Nova sentença foi prolatada em 18/06/2024, desta vez, condenando o recorrente às mesmas penas, bem como ao pagamento do valor de R$9.000,00 (nove mil reais) ao lesado, a título de danos materiais. Razão assiste à defesa ao arguir a nulidade da sentença nesse ponto. Com efeito, a condenação por danos materiais, constitui verdadeira reformatio in pejus indireta, uma vez que se agravou a reprimenda anteriormente aplicada na sentença anulada, existindo tão somente recurso defensivo. A jurisprudência é pacífica no sentido de que «em obediência ao CPP, art. 617, que veda a reformatio in pejus, não se admite que, anulada a sentença no julgamento de recurso exclusivo da defesa, a nova decisão da mesma causa ou questão possa agravar-lhe a situação» (AgRg no REsp. Acórdão/STJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 12/5/2020, DJe de 19/5/2020). De qualquer modo, ainda que assim não fosse, impossível seria condenar o apelante por danos materiais, haja vista não haver pedido expresso nesse sentido na denúncia. Destarte, a fim de sanar tal nulidade, afasta-se a condenação por danos materiais. No mérito, a prova é inequívoca no sentido de que, em 29/04/2019, o recorrente, consciente e voluntariamente, obteve, para si ou para outrem, vantagem indevida de R$ 12.500,00, em prejuízo de Silvio César Lopes, mediante meio fraudulento, consistente em simular a venda de um automóvel, obtendo indevidamente a quantia referente ao pagamento do veículo. Segundo a prova produzida, o lesado apresentou interesse na compra do veículo que se encontrava no interior do estabelecimento empresarial Garra Veículos, onde foi apresentado ao ora recorrente e decidiu efetuar a compra, ocasião em que realizou uma transferência bancária no valor de R$ 12.500,00 para a conta do recorrente, ficando combinado que após o feriado ambos iriam aos órgãos de praxe cumprir os trâmites legais de transferência de propriedade do automóvel. Todavia, poucos dia após efetivado o negócio jurídico, mais precisamente no dia 02/05/2019, o lesado realizou uma consulta ao sítio eletrônico do DETRAN/RJ e verificou que havia um gravame de crime de estelionato para o veículo automotor, quando então tentou contatar o apelante por diversas vezes sem sucesso, momento em que constatou ter caído em um golpe. No plano da resposta penal, há que se fazer alguns reparos. Primeiramente, extrai-se da FAC do recorrente que ele possui nove condenações transitadas em julgado (anotações 4, 7, 10, 11, 12, 13, 14, 20 e 36), sendo que a anotação 36 refere-se a fato posterior, não podendo ser utilizada para exaspero de pena. Quanto à anotação 20, embora com trânsito em julgado posterior, se refere a fato anterior ao que trata estes autos, prestando-se para o reconhecimento dos maus antecedentes, consoante entendimento já pacificado do STJ. A condenação utilizada pelo julgador de 1º grau para reconhecimento da reincidência (anotação 17, relativa ao processo 0208706-82.2020.8.19.0001) não possui trânsito em julgado, razão pela qual não se presta a configurar a referida agravante. Feitas tais considerações, conclui-se que oito condenações se prestam para configuração de maus antecedentes na 1ª fase dosimétrica. Quanto ao pleito defensivo de afastamento de tais condenações, em que pese a existência de entendimento contrário, com fundamento na teoria do direito ao esquecimento, há que se levar em conta que a Suprema Corte firmou tese em sede de Repercussão Geral, dispondo que: «Não se aplica ao reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do CP» (STF - Tribunal Pleno - RE 593818, Relator(a): ROBERTO BARROSO). Ademais, chama a atenção que as condenações valoradas para esse fim foram também por crimes patrimoniais, sendo certo que uma delas (anotação 11) transitou em julgado em 11/01/2012, com pena de 06 anos e 08 meses, portanto, há menos de dez anos do fato, e poderia até mesmo ter sido utilizada para configurar reincidência. A pena-base estabelecida pelo julgador (04 anos e 40 DM) mostra-se demasiada, devendo ser abrandada para 02 anos e 20 DM, considerando-se a existência de oito condenações, em observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Na 2ª fase, deve ser afastada a agravante da reincidência, pois, como já restou assente, a condenação utilizada pelo julgador não possui trânsito em julgado. Em face do reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, diminui-se a reprimenda em 1/6. Abranda-se o regime de cumprimento de pena para o semiaberto, tendo em vista que as circunstâncias judiciais não são completamente favoráveis ao apelante (CP, art. 33, § 3º). Por fim, em relação à pretendida gratuidade de justiça e dispensa do pagamento de custas processuais, tal pleito deverá ser dirigido ao Juízo da Execução em momento oportuno (Súmula 74, do TJERJ), uma vez que na presente fase constitui-se parte integrante e obrigatória da sentença, porquanto consectário lógico. RECURSO CONHECIDO, ACOLHIDA A PRELIMINAR PARA AFASTAR A CONDENAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E, NO MÉRITO, PARCIALMENTE PROVIDO.

(Origem do acórdão e Ementa p/citação - Somente para assinantes ADM Direito)
Não perca tempo. Cadastre-se e faça agora sua assinatura ADM Direito