Carregando…

DOC. 379.5366.5641.4595

TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE ESTUPRO, EXTORSÃO E ROUBO. COMPROVAÇÃO. 1)

Tratando-se de crime sexual, praticado geralmente às escondidas, e muitas vezes sem deixar vestígios, a palavra da vítima possui inestimável valor probatório. E, como no caso, quando coerente e harmônica com os demais elementos de prova, tem-se como decisiva para a condenação. Também nos crimes contra o patrimônio, a palavra da vítima se mostra perfeitamente apta a embasar um decreto condenatório, porquanto, à míngua de qualquer elemento a sugerir interesse escuso ou atitude leviana, lícito concluir que a intenção da vítima, com quem o acusado não tivera mínimo contato anterior, seja descrever fidedignamente o delito e indicar o culpado, e não increpar pessoa sabidamente inocente. 2) No caso em análise, logo após os crimes a vítima compareceu em delegacia de polícia, onde lhe foram exibidas fotografias de vários indivíduos, não reconhecendo de pronto o seu abusador; contudo, após ser intimada para novo comparecimento e visualizar um mosaico com novas fotografias de indivíduos diversos, mas com as mesmas características por ela fornecidas, reconheceu sem dúvida o réu como o autor dos delitos. 3) Embora sem previsão expressa na legislação, trata-se o reconhecimento fotográfico de importante diligência investigatória autorizada ao delegado de polícia para o esclarecimento da infração penal, nos termos do CPP, art. 6º, III. Aplicável por extensão ao reconhecimento fotográfico, o CPP, art. 226, por sua vez, dispõe que a pessoa a fazer o reconhecimento será convidada a descrever o suspeito e, em seguida, se possível, será feito o alinhamento deste junto a outras pessoas com características semelhantes ou ¿ no caso de fotografias ¿ de sua fotografia junto a imagens de outros indivíduos. 4) Acorde se observa do depoimento prestado pela vítima em juízo, o reconhecimento fotográfico formalizado em sede policial atendeu rigorosamente ao disposto no CPP, art. 226. Como bem pontuado pelo douto juízo a quo, verbis, ¿a ofendida não foi induzida a um reconhecimento de uma pessoa específica, mas, ao contrário, lhe foram mostradas fotografias de pessoas diversas, logo, não tendo, no caso em concreto, que se falar em falsas memórias¿. 5) Ao depor em juízo, a vítima contou que caminhava em via pública em direção ao trabalho, um pouco depois das cinco horas da manhã, quando o réu se aproximou numa motocicleta e, percebendo-a sozinha, a abordou com uma arma de fogo e ordenou que subisse na garupa do veículo; o réu passou a trafegar pelas redondezas e, ao chegar numa rua sem saída, perguntou o que ela tinha para lhe dar e ordenou o desbloqueio de seu aparelho de telefone celular para lhe transferir a quantia de R$5mil; ao constatar, porém, que suas contas bancárias estavam sem saldo, o réu obrigou-a a fazer-lhe sexo oral, tocando suas partes íntimas; desse modo, trafegou por mais alguns pontos e, fingindo formarem ambos um casal, afugentava as pessoas, chegando a apontar a arma para um transeunte; por fim, depois de muito implorar, o réu a libertou próximo ao um shopping center, subtraindo seu aparelho celular; nos dias subsequentes ela recebeu várias mensagens de uma das instituições bancárias informando a tentativa de acesso à sua conta. 6) Em juízo, a vítima tornou a reconhecer o réu, e dessa vez pessoalmente, também com a adoção das prescrições do CPP, art. 226. No ponto, vale registrar que o STJ evoluiu seu entendimento sobre o reconhecimento fotográfico, passando a considerá-lo como prova inidônea para sustentar uma condenação acaso inobservado o CPP, art. 226. Aquele E. Sodalício não infirma, contudo, a possibilidade de que o reconhecimento realizado com segurança em juízo sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, ratificando aquele feito em sede policial, realizado com a observância do CPP, art. 226, seja utilizado como meio idôneo de prova para fixar a autoria delitiva, escorando o decreto condenatório. 7) Não se descura a alegação da defesa de que o réu não poderia ter cometido os delitos imputados porque, por volta daquele mesmo horário, teria praticado um estupro contra outra vítima, crime pelo qual já condenado pelo mesmo juízo de primeiro grau (processo 0815517-80.2023.8.19.0202). O argumento, porém, mais reforça a convicção acerca da autoria delitiva, porquanto, em consulta ao sistema informatizado do TJERJ, contata-se ter sido aquele outro estupro praticado no mesmo dia, em bairro próximo e sob idêntico modus operandi. A vítima daquele crime descreveu o criminoso em uma motocicleta ¿ que, com uma arma de fogo, a abordou quando ia para o trabalho, a obrigou subir na moto e a praticar atos sexuais, inclusive sexo oral, circulando por vários locais ¿ de maneira praticamente igual às descrições fornecidas pela vítima do presente feito. Outrossim, ao contrário do que afirmado pela defesa, naquele outro feito a vítima contou ter sido rendida por volta das 4:30h da manhã e perdurado toda a ação delitiva em torno de vinte minutos ¿ o que daria tempo mais do que suficiente para o criminoso abordar uma segunda vítima em via pública em bairro circunvizinho. 8) O fato de haver a vítima do outro processo afirmado que o réu aparentava estar na ocasião alcoolizado, diversamente do que relatado pela vítima do presente feito, não impressiona: a circunstância, além de transitória, não infirma todo o restante de provas desfavoráveis ao réu. A rigor, o que chama a atenção é versão em autodefesa apresentada pelo réu no interrogatório em juízo, pois, embora tenha negado os crimes, não informou com clareza onde se encontrava no início daquele dia e sequer arrolou como testemunha a esposa, com quem disse ter estado ainda no período da manhã. Outrossim, do outro processo mencionado ainda se extrai que o réu, inusitadamente, após acariciar a vítima e elogiar sua beleza, a obrigou a anotar seu próprio número de telefone celular. O descuido, além de haver contribuído para sua identificação, demonstra que, efetivamente, naquela madrugada, ele estava se deslocando com uma motocicleta na região e permite concluir ter posteriormente convergido seu caminho com o da vítima do presente feito. Desprovimento do recurso.

(Origem do acórdão e Ementa p/citação - Somente para assinantes ADM Direito)
Não perca tempo. Cadastre-se e faça agora sua assinatura ADM Direito