TJRJ. DIREITO CIVIL.
Ação declaratória de inexistência de débito c/c indenizatória. Sentença de procedência do pedido inicial, em demanda na qual o autor discute a existência de dois contratos de empréstimo consignado, o qual afirma não terem sido contratados, com desconto em benefício previdenciário. Não se acolhe a preliminar de carência de ação, suscitada pela instituição financeira ré diante de suposta ausência de interesse de agir, decorrente da inexistência de pretensão resistida e do não esgotamento da via administrativa para a solução da controvérsia. Ainda que a pretensão não sofresse resistência pelo réu, o que não é o presente caso, o interesse de agir exsurgiu da ofensa a direito do autor por parte do banco, que procedeu a descontos diretamente em seu benefício previdenciário em razão do questionado contrato de empréstimo consignado. O interesse de agir, por óbvio, não depende do esgotamento da via administrativa, sob pena de se subverter o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, consagrado no CF/88, art. 5º, XXXV. Diante dos referidos descontos, o ajuizamento da ação dispensa a prévia, e por vezes infrutífera, via administrativa. Relação jurídica consumerista. Consumidor por equiparação do art. 17, CDC e de fornecedor do art. 3º do Diploma Consumerista. Incidência do Verbete de Súmula 297/STJ. É objetiva a responsabilidade do réu, a teor do que dispõe o CDC, art. 14, bastando a demonstração do fato, do dano e do nexo causal, sendo prescindível a presença da culpa, somente podendo ser afastada a responsabilidade no caso de comprovação das excludentes previstas no § 3º do mesmo dispositivo legal. A controvérsia consiste, portanto, em verificar se houve falha na prestação do serviço do réu no que se refere aos descontos efetuados no benefício previdenciário do autor, em razão de empréstimo consignado que a procuradora do correntista afirma não haver sido contratado, já que não há discussão quanto à ocorrência dos descontos nos proventos de aposentadoria. Cinge-se a discussão à validade do instrumento de contrato oportunamente exibido pelo réu, conforme acervo documental, o que autorizaria a realização dos descontos impugnados. No caso destes autos, alegando o autor que a assinatura aposta no contrato não é dele, é do banco réu o ônus de comprovar a autenticidade da firma, por meio de perícia grafotécnica, o que deixou de requerer. Tal entendimento encontra-se consolidado no STJ, diante do julgamento do Tema Repetitivo 1061. Trata-se, na verdade, de operação de disponibilização de crédito mediante fraude, por evidente falha na prestação do serviço, já que não houve vontade exteriorizada para a celebração do negócio jurídico, razão a qual revela-se correta a declaração de inexistência de relação jurídica contratual entre as partes com relação aos contratos mencionados na inicial e das dívidas deles decorrentes, segundo exposto pelo Juízo sentenciante. Verifica-se que o autor comprovou efetivamente os fatos constitutivos de seu direito, de acordo com a regra do art. 373, I do CPC, certo que não são apenas verossimilhança de suas afirmações. O réu deixou de comprovar os fatos extintivos, modificativos ou impeditivos do direito autoral, dado que os documentos que compõem o acervo probatório não afastam a caracterização da fraude no serviço fornecido, que em tese poderiam desconstituir as alegações autorais, ônus que lhe incumbia, segundo o CPC, art. 373, II e art. 14, §3º, do CDC, sendo que não se prestaram a este fim. Comprovada a ocorrência da fraude, a ausência de validade do contrato trazido aos autos afasta qualquer razão a justificar que o contrato adulterado produza efeitos na esfera do autor que com ele jamais anuiu. Aplica-se ao presente caso a Teoria do Risco do Empreendimento, consagrada no CCB, art. 927. Mesmo que tenha havido contratação por terceiro mediante fraude, o que ficou comprovado, não há isenção do dever de reparação dos danos, eis que o entendimento sumulado por esta Corte Estadual de Justiça é de que a fraude praticada por terceiro integra os riscos do empreendimento nas relações consumeristas e não exclui a responsabilidade dos prestadores e fornecedores de serviço, sendo fortuito interno. Aplicação da Súmula . 94 deste Tribunal de Justiça e a Súmula 479/STJ. Incumbia ao réu comprovar a efetiva contratação do empréstimo consignado e consequentemente a legitimidade dos descontos efetuados nos proventos de aposentadoria do autor, o que não se demonstrou. Configurada a falha na prestação do serviço, de forma que o apelo não tem êxito algum, não carecendo de reprimenda a sentença ora guerreada. Quanto aos danos materiais, aplica-se ao caso a firmada pela Corte Especial do STJ no julgamento dos embargos de divergência EAREsp. Acórdão/STJ, em 21.10.2020, no sentido de que «A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do CDC, art. 42) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva», ante a ausência de engano justificável. Merece, também, manutenção a sentença com relação aos danos morais que, no caso em tela, operam in re ipsa. Entendimento deste Egrégio TJERJ. A atuação do réu/apelante teve potencial para causar danos à personalidade do autor, que teve seu benefício previdenciário reduzido, com repercussão que foge do mero aborrecimento, de forma que a verba compensatória arbitrada no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) não alcança qualquer redução, estando bem sopesada. Aplica-se, na hipótese, o verbete sumular . 343 deste Tribunal de Justiça. Consta que o Juízo singular já determinou o depósito do valor creditado na conta do autor, referente ao empréstimo consignado impugnado, sendo depositado judicialmente o montante, como destacado. À luz dos elementos presentes, não merece êxito o pleito recursal. Infere-se que a r.sentença ora vergastada deve ser mantida na íntegra por se apresentar escorreita. Recurso desprovido, com a majoração dos honorários fixados anteriormente para 20% (vinte por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 85, § 11 do CPC/2015.
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