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DOC. 541.0431.1739.5169

TJRJ. Apelação Criminal. RONIELE CHAVES DIAS foi condenado pelo crime previsto nos arts. 33, caput, e 35, caput, ambos na forma do art. 40, IV, todos da Lei 11.343/06, em concurso material, às penas de 12 (doze) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime fechado, e 1775 (mil, setecentos e setenta e cinco) dias-multa, no menor valor fracionário, e DIEGO DIAS LEITE foi sentenciado nas penas do art. 33, § 4º, na forma da Lei 11.343/06, art. 40, IV, às penas de 02 (dois) anos e 01 (um) mês de reclusão, em regime aberto, e 207 (duzentos e sete) dias-multa, na mínima fração legal, substituída a sanção prisional por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário-mínimo. Os acusados foram presos em flagrante no dia 24/05/2021. Foi negado ao denunciado RONIELE o direito de recorrer em liberdade. O acusado DIEGO foi solto por ordem parcialmente concedida no Habeas Corpus 0038017-71.2021.9.19.0000, no dia 01/07/2021. Recurso ministerial visando a condenação do acusado DIEGO DIAS LEITE, pela prática do crime do art. 35, caput, combinado com o art. 40, IV, ambos da Lei 11.343/06, na forma da denúncia. Apelo defensivo de RONIELE CHAVES DIAS, requerendo a absolvição, sustentando a fragilidade probatória. Alternativamente, pretende seja afastada a causa de aumento de pena prevista na Lei 11.343/06, art. 40, IV. Recurso de apelação pela defesa de DIEGO DIAS LEITE pleiteando a absolvição por fragilidade probatória. Subsidiariamente, requer a exclusão da majorante da Lei 11.343/2006, art. 40, IV. Parecer da Procuradoria de Justiça no sentido do conhecimento dos recursos, provimento do ministerial para que o acusado DIEGO DIAS LEITE seja condenado pela prática do crime do art. 35, na forma da Lei 11.343/06, art. 40, IV, afastando-se o tráfico privilegiado, e o desprovimento dos apelos defensivos. 1. Aduz a denúncia que no dia 24/05/2021, na Avenida Paraíba, 534, bairro Dom Bosco, Volta Redonda, os denunciados, de forma livre, consciente e voluntária, em comunhão de ações e desígnios entre si, guardavam e mantinham em depósito, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar 106g (cento e seis gramas) de maconha, acondicionada em 01 (um) pequeno tablete parcialmente em volto por fita adesiva. Consta ainda que, nas mesmas condições de data e local, os denunciados, de forma livre, consciente e voluntária, em comunhão de ações e desígnios entre si, portavam 01 (uma) arma de fogo consistente em uma pistola, calibre .40 e 13 (treze) munições do mesmo calibre .40 sem autorização ou em desacordo com determinação legal e regulamentar. Consta ainda que, em data que não se pode precisar, mas certamente anterior a 24/05/2021, os denunciados, de forma livre, voluntária e consciente, associaram-se entre si e a terceiras pessoas não identificadas, integrantes da facção criminosa dominante no local, a saber Comando Vermelho, para o fim de praticar, reiteradamente ou não, o tráfico de drogas em Volta Redonda. 2. O pleito absolutório merece ser acolhido. 3. Infere-se dos autos que foi apreendida significativa quantidade de drogas, arma de fogo e munições, mas não restaram claras as circunstâncias da abordagem e do ingresso dos militares nas moradias dos acusados. 4. Conquanto admissível a prolação de uma sentença condenatória com base nos depoimentos dos agentes da Lei, a hipótese é de dúvida quanto à legalidade da ação dos militares que, sem mandado e motivos justificáveis, abordaram o acusado DIEGO na porta de casa, ingressaram na sua residência e na do denunciado RONIELE, que ficava no mesmo quintal, e apreenderam materiais ilícitos. 5. Segundo os depoentes policiais militares, eles foram noticiados de que estaria ocorrendo tráfico na localidade, e quando lá chegaram, encontraram o acusado DIEGO no portão, sem estar portando nada de ilícito. Após isso, consoante os militares, o denunciado DIEGO autorizou o ingresso em sua residência, onde foram arrecadados uma balança e um radiotransmissor. Ele teria informado, ainda, que o corréu RONIELE estava em outra residência, onde foi encontrada toda a droga e o armamento. 6. Compartilho do posicionamento dos Tribunais Superiores, no sentido de que a denúncia anônima de um suspeito por estar traficando não são elementos aptos a autorizarem a entrada dos militares na casa dos denunciados. Eventual confissão do fato, ou até a permissão para ingresso e revista na sua moradia não foi ratificada em juízo. Não há evidências de que foi expressa de forma livre e espontânea. Ademais, os militares não mencionaram que visualizaram atividade de movimento de venda no local, tampouco no entorno da moradia do apelante. Não é crível que alguém que possua material ilícito dentro de casa tenha, espontaneamente, franqueado ingresso, buscas e apreensão em sua residência. Soa no mínimo estranho que uma pessoa, ciente de que mantinha em depósito razoável quantidade de substância ilícita, autorize buscas em no local. 7. Com efeito, não se infere que havia prévio conhecimento de que estivesse ocorrendo crime na aludida residência. O encontro do material ilícito não torna válida a diligência. 8. Cabia aos policiais antes da abordagem, no mínimo, observarem o lugar para obterem provas mais robustas de que na casa estava ocorrendo algum crime. Nada justifica que os agentes da lei extrapolem a sua atribuição, passando ao largo de garantias constitucionais, notadamente a prevista no CF/88, art. 5º, XI, que consagrou o direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. 9. Ademais, como notório, os agentes de segurança costumam atuar com certa truculência quando abordam pessoas que moram em comunidades, e muitas vezes, em desacordo com os mandamentos legais e constitucionais, portanto, é imperativa uma análise cuidadosa dos fatos narrados. 10. Concessa máxima vênia, a diligência realizada mostrou-se confusa. Os agentes da lei sequer sabiam precisar como era o local, quem morava lá, e como era a disposição das casas, demonstrando total descuido quanto ao domicílio das pessoas. Assim, cabe a reflexão: tudo é valido para se combater a criminalidade? Até a tolerância à violação de garantias constitucionais arduamente conquistadas em prol de um obscuro bem comum? Este tipo de pensamento dá azo ao temerário direito penal do inimigo. 11. Subsistem dúvidas quanto à prática do delito apurado, eis que toda a prova decorre de uma conduta inicial com indícios de haver passado ao largo das formalidades legais e constitucionais. 12. Em um estado democrático de direito não há margem para uma condenação criminal, com base em suposições, incertezas ou ações ilegais ou em descompasso com os mandamentos constitucionais. 12. Em tal contexto, aplicável o princípio in dubio pro reo, impondo-se a absolvição dos denunciados quanto aos crimes que lhes foram atribuídos. 13. Recursos conhecidos, negado provimento ao ministerial e providos os defensivos para absolver os recorrentes dos delitos a eles imputados, com fulcro no CPP, art. 386, VII. Expeça-se alvará de soltura em favor de RONIELE CHAVES DIAS. Façam-se as comunicações devidas.

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