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DOC. 546.3491.7705.5833

TJRJ. HABEAS CORPUS. CÁRCERE PRIVADO SOB A ÉGIDE DA LEI MARIA DA PENHA. PRISÃO PREVENTIVA DEVIDAMENTE MOTIVADA. PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORAVÉIS. IRRELEVÂNCIA. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1)

Conforme se extrai dos autos, o Paciente é casado com a vítima JULIANA SARMANHO IGLESIAS, quem relata ser por ele constantemente agredida fisicamente e mantida em cárcere privado por motivo de ciúmes, ao ponto de, aproveitando o momento em que o Paciente dormia, ter pulado do segundo andar da casa ( caindo sobre as lanças do portão, ferindo gravemente sua perna). A vítima ainda relatou múltiplos hematomas e, mesmo, fraturas em dedos e braços produzidas pelo Paciente que, a mantendo encarcerada, muitas vezes a impediu de obter atendimento médico. 2) Representando pela imposição de prisão preventiva, a Promotoria de Justiça salientou a existência de, ao menos, sete procedimentos em que o Paciente figura como autor de crimes decorrentes de violência doméstica, três deles envolvendo a vítima JULIANA, e em um desses casos houve prisão em flagrante. 3) Registre-se, inicialmente, que embora sustente a impetração que a versão fornecida pela vítima seria fantasiosa e fictícia, encontrando-se em desacordo com outros depoimentos colhidos em sede inquisitorial, o impetrante não acostou ao mandamus nenhuma peça de informação, nem mesmo a folha de antecedentes criminais do Paciente, motivo pelo a arguição não ultrapassa o campo especulatório. 4) De toda sorte, a matéria constitui argumentação relativa ao mérito da ação penal, e não se pode pretender a sua apreciação antes mesmo do seu enfrentamento pelo juízo de origem, sob pena de se estar incidindo em supressão de instância. Além disso, tampouco é adequada sua análise pela via estreita do Habeas Corpus, inidônea para o exame aprofundado de material fático probatório. Precedentes. 5) Por outro lado, pondere-se ser suficiente para o juízo cautelar a verossimilhança das alegações, e não o juízo de certeza, próprio da sentença condenatória. Não discrepa a jurisprudência do STJ, que é pacífica no sentido de que para a decretação da custódia cautelar exigem-se indícios suficientes de autoria e não a prova cabal desta, o que somente poderá ser verificado em eventual decisum condenatório, após a devida instrução dos autos (628892 / MS, AgRg no HC, Rel. Min. FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, j. 23/02/2021). Precedente. 6) Na linha da decisão atacada, o panorama nela descrito permite divisar que se encontra a integridade física da vítima em situação de efetivo risco, o que legitima a imposição de sua custódia com base no disposto no Lei 11.3430/2006, art. 12-C, §2º, incluído pela Lei 11.827/2019. 07) De fato, da maneira de execução do delito, tal como a descreve a decisão impugnada, sobressai a extrema violência do Paciente, permitindo estabelecer um vínculo funcional entre o modus operandi do crime, cuja acentuada reprovabilidade é capaz de demonstrar sua periculosidade, e a garantia da ordem pública. Precedente. 8) Nessas condições, há necessidade da custódia cautelar do Paciente, à luz do seu comportamento descrito nas peças de informação, a fim de resguardar a incolumidade física e psicológica da vítima de violência doméstica, situação em que, à luz de pacífico entendimento jurisprudencial, fica caracterizada a excepcional necessidade de imposição da medida extrema e, logicamente, descartada a possibilidade de concessão de liberdade provisória. Precedentes. 9) Por outro lado, para fins cautelares, não pode ser desconsiderado o fato de ostentar o Paciente anotações criminais por outros processos. A propósito, já decidiu o Supremo Tribunal Federal que a garantia da ordem pública, por sua vez, visa, entre outras coisas, evitar a reiteração delitiva, assim, resguardando a sociedade de maiores danos (HC 84.658/PE, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 03/06/2005). 10) Neste mesmo sentido encontra-se consolidada a jurisprudência no Eg. STJ, que já assentou o entendimento segundo o qual inquéritos policiais e processos penais em andamento, muito embora não possam exasperar a pena-base, a teor da Súmula 444/STJ, constituem elementos aptos a revelar o efetivo risco de reiteração delitiva, justificando a decretação ou a manutenção da prisão preventiva» (RHC 68550/RN, Sexta Turma, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, DJe 31/3/2016). Precedentes. 11) Por isso, conclui-se que a segregação cautelar do Paciente se encontra solidamente fundamentada, tendo a autoridade impetrada apontado elementos concretos dos autos para justificar a prisão sob o pressuposto da garantia da ordem pública, como a necessidade de evitar novas agressões à vítima. 12) Observe-se, por oportuno que, excepcionalmente, e especialmente nos casos que envolvem violência doméstica e familiar contra as mulheres, é possível a decretação da prisão preventiva de forma autônoma ou independente, de forma desvinculada e não subsidiária às hipóteses em que há o descumprimento de medidas protetivas ou para garantir a execução destas, isso em atenção ao princípio da adequação, insculpido no, II do CPP, art. 282. 13) A decisão judicial, portanto, revela concretamente a necessidade de imposição de privação da liberdade ambulatorial ao Paciente, atendendo-se o princípio insculpido no CF/88, art. 93, IX, motivo pelo qual encontra amparo no art. 5º LXI da CF. 14) Nessas condições, a prisão provisória é legítima, compatível com a presunção de inocência e revela ser, logicamente, indevida a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, ante a presença de elementos concretos indicativos de que as providências menos gravosas seriam insuficientes para o caso. Com efeito, a incapacidade de medidas cautelares alternativas resguardarem a ordem pública decorre, a contrario sensu, da própria fundamentação expendida para justificar a necessidade da prisão preventiva. Precedentes. 15) Conclui-se, da leitura dos arestos aqui reproduzidos que, da efetiva comprovação da imprescindibilidade da prisão preventiva segue, naturalmente, a inaplicabilidade de outras medidas cautelares, na medida em que estas não se revelam aptas a tutelar os fins por ela visados. 16) Tampouco colhe êxito a alegação de que extemporaneidade da medida extrema, até porque requerida pelo Ministério Público em data recente (27 de novembro de 2024) e, principalmente, tendo em vista ser a periculosidade do Paciente fato atual. Precedentes. 17) Inequívoco que, no caso em apreço, ao decreto prisional não falta a necessária contemporaneidade da medida, porque o risco à ordem pública é fato atual que alicerça o decisum, restando inequívoca a persistência dos fatos justificadores dos riscos que se pretende, com a prisão, evitar. 18) Extrai-se ainda dos autos, que o mandado de prisão expedido contra o Paciente permanece descumprido; ele encontra-se foragido, o que somente reforça a necessidade de decretação de sua custódia cautelar, para garantia da aplicação da lei penal. Precedentes. 19) Finalmente, das informações prestadas pela digna autoridade apontada coatora (às fls. 27/29), o Paciente já se encontra denunciado - ao contrário do que sustenta a impetração. Além disso, o Juízo singular esclareceu ter determinado a remessa dos autos à Defensoria Pública da vítima, para que esta se manifeste também sobre o pedido de revogação de prisão, oportunidade após a qual o pedido de liberdade será reapreciado pelo próprio Juízo singular. Nessas condições, o reconhecimento de que o Juízo impetrado incorre em ilegalidade ou abuso é impossível. Ordem denegada.

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