TJRJ. APELAÇÃO. 16, CAPUT, DA LEI 10.826/03. RECURSO DEFENSIVO PRETENDENDO O RECONHECIMENTO DE NULIDADE, EM VIRTUDE DA PROVA TER SIDO OBTIDA COM INVASÃO DE DOMICÍLIO. NO MÉRITO, PUGNA PELA ABSOLVIÇÃO QUANTO AO DELITO PREVISTO na Lei 10.826/03, art. 16. PROCURADORIA QUE PUGNA PELO RECONHECIMENTO DA NULIDADE NA DOSIMETRIA DA PENA, VEZ QUE BASEADA NA SANÇÃO PREVISTA Aa Lei 10.826/03, art. 12.
Inicialmente, os pleitos da ilustrada Procuradoria de Justiça não merecem prosperar. Isso porque, em razão da primazia do princípio da non reformatio in pejus, a ausência de impugnação recursal pelo Ministério Público impede o conhecimento de matéria que venha a agravar a situação jurídica do condenado, como seria o caso de anulação da sentença para reforma na fixação da pena, ou mesmo de reconhecimento, de ofício, da sanção mais gravosa. Aplica-se ao caso o verbete sumular 160 do STF, in verbis: É nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício". A preliminar arguida pela defesa, por sua vez, se confunde com o mérito e será analisada a seguir. Emerge dos autos que no dia 11/11/2020 policiais civis que integravam a «Força Tarefa de Combate à Milícia» foram até a residência do recorrente com a finalidade de apurar informações no sentido de que ali residiria um miliciano integrante da milícia de Campo Grande, tendo os policiais civis visualizado um veículo Hyundai IX35, cor prata, placa KRW-4872 e, sobre o banco do carona, uma pistola tendo o recorrente entregue aos policiais a chave do veículo possibilitando a apreensão da arma. Além disso, os policiais foram em direção à residência e avistaram, através da janela da sala, uma espingarda calibre 12 no interior do imóvel, tendo o recorrente franqueado a entrada dos policiais, os quais encontraram, além da mencionada espingarda, os demais acessórios e munições apreendidos. A materialidade delitiva vem estampada pelo Registro de Ocorrência de fls.08/09; Auto de Apreensão de fls.10; Auto de Infração de fls. 20/21; Autos de encaminhamento de fls. 36, 41, 44 e 47; Laudo de exame em arma de pasta 49 e Laudo de exame em munições de pasta 52, atestam que o recorrente estava na posse de uma espingarda Boito, calibre 12, número de série G07432413, uma pistola TAURUS, calibre.380, número de série KBP20453, dois carregadores TAURUS, calibre.380, seis cartuchos de calibre .38, vinte e dois cartuchos de calibre 12 e vinte cartuchos de calibre .380, bem como pelos depoimentos prestados em sede policial e em juízo. De início, deve ser afastada a alegação de nulidade das provas obtidas, porque teriam sido realizadas com violação de domicílio. Conforme revelou as provas, os policiais não chegaram ao recorrente apenas por uma denúncia anônima e, sim, em virtude da localização e apreensão da pistola no interior do veículo que se encontrava estacionado na calçada da casa do recorrente, demonstrando a circunstância de flagrante delito que culminou com o ingresso dos policiais na residência do apelante. Nesse contexto, verifica-se que os policiais estavam amparados para adentrar na residência em que todo o material ilícito foi arrecadado pelas circunstâncias flagranciais que encontraram, não havendo que se falar em violação de domicílio e nulidade da prova. No que tange ao crime de posse ilegal de arma de fogo de uso restrito, ao contrário do sustentado pela defesa técnica, a prova não é frágil, estando a condenação amparada em conjunto probatório convincente, robusto e suficiente, no qual restaram amplamente demonstradas a materialidade e a autoria. Destaca-se que os policiais civis afirmaram, de forma uníssona, que se depararam com um automóvel estacionado bem em frente ao imóvel, onde conseguiram visualizar uma pistola disposta sobre um dos bancos e que um deles avistou na residência, por meio do portão de vidro, uma espingarda. Destacaram que, após entrada autorizada na residência, encontraram a referida espingarda, munições e carregadores. Além disso, o próprio recorrente admitiu a posse das referidas armas, sustentando, no entanto, que pertenciam ao seu falecido pai e estavam registradas em nome dele. A apreensão do artefato bélico restou confirmada pelos laudos de pastas 49 e 52. Dessa forma, configurada a certeza da autoria delitiva do recorrente. De se registrar estar-se diante de uma condenação estruturada, que se baseou na pluralidade de elementos colhidos aos autos, caderno de provas robusto, coerente e diversificado, consubstanciado, inclusive, por autos de apreensão e laudos técnicos periciais e depoimentos dos agentes da lei. Nessa toada, deve-se afastar qualquer demérito ou descrédito à palavra dos policiais da ocorrência, apenas por força da sua condição funcional. De outro turno, verifica-se que não houve a produção de qualquer contraprova relevante, a cargo da Defesa (CPP, art. 156), tendente a melhor aclarar os fatos, tampouco para favorecer a situação do recorrente, ciente de que «meras alegações, desprovidas de base empírica, nada significam juridicamente e não se prestam a produzir certeza» (STJ, Rel. Min. José Delgado, 1ª T. ROMS 10873/MS). Correto o juízo de desvalor da conduta vertido na condenação que deve ser mantida, não havendo falar-se em absolvição a qualquer título. No plano da dosimetria, a sentença desafia ajustes. Inicialmente, destaca-se que a decisão de 1º Grau quantificou a pena como base nas sanções previstas aa Lei 10.826/06, art. 12, embora a condenação tenha se dado com base no art. 16 da mesma lei, servindo de baliza para análise da pena, em virtude da aplicação do princípio da non reformatio in pejus. A pena-base aplicada deve ser abrandada, haja vista que a fundamentação empregada não suporta o exaspero. O julgador monocrático considerou, com base na própria conduta conscientemente assumida que o apelante demonstra personalidade incompatível com o tipo ideal de personalidade do homem médio. No entanto, é de se reformar neste ponto, haja vista que os autos não possuem laudo técnico a permitir o discurso sobre a personalidade do agente. Além disso, a presença de sentença penal condenatória não transitada em julgado, não autoriza o reconhecimento de conduta social voltada para o crime. Dessa forma, a pena-base deve ser fixada no mínimo legal, ou seja, 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes. Reconhecida a atenuante de confissão, prevista no CP, art. 65, III, «d». Contudo, deixa-se de reduzir as penas do crime de roubo abaixo do mínimo legal a teor do disposto na Súmula 231/STJ. Na terceira fase, ausentes causas de aumento ou de diminuição de pena. Com isso, a sanção imposta ao crime de roubo se aquieta em 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo. O regime aberto é o adequado e suficiente a garantir os objetivos da pena, tendo em vista o quantum de pena imposto nos termos do art. 33 §2º, «c» do CP. Presentes os requisitos do CP, art. 44, substitui-se a pena privativa de liberdade por uma pena restritiva de direitos, consistente em prestação de serviços à comunidade. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, na forma do voto do Relator.
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