TJRJ. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. RECURSO MINISTERIAL. CRIME DE PERSEGUIÇÃO. STALKING. CONDUTAS PRATICADAS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 14.132/2021, QUE INCLUIU O art. 147-A NO CÓDIGO PENAL E REVOGOU A CONTRAVENÇÃO PENAL DE PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE. ABOLITIO CRIMINIS. INOCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE NORMATIVO-TÍPICA. REITERAÇÃO DA CONDUTA. ULTRATIVIDADE DO LCP, art. 65. CRIME DE VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA CONTRA A MULHER (CP, art. 147-B. CONDUTAS PRATICADAS ENTRE OS MESES DE NOVEMBRO DE 2019 E JUNHO DE 2023. LEI 14.188/2021. NOVATIO LEGIS INCRIMINADORA. CONDUTAS PRATICADAS ANTES DE 28/07/2021 NÃO ERAM PREVISTAS COMO CRIME. IRRETROATIVIDADE. 1)
Na espécie, o Ministério Público ofereceu denúncia contra o recorrido como incurso na conduta tipificada dos arts. 147-A e 147-B, na forma dos arts. 69 e 71, todos do CP, com observância dos consectários da Lei 11.340/2006. 2) Nesse contexto, no dia 31/03/2021 entrou em vigor a Lei 14.132/2021 que incluiu o art. 147-A no CP, criminalizando a conduta de perseguição. Esta lei revogou a contravenção penal de perturbação à tranquilidade, prevista no Decreto-lei 3.688/1941, art. 65, tendo o Legislador considerado que o bem jurídico deve ser tutelado com mais rigor, tratando-se, portanto, de novatio legis in pejus. Saliente-se que o tipo do art. 147-A somente se configura com a prática reiterada de condutas. 3) In casu, a denúncia imputa ao recorrido supostas práticas de perseguição no período compreendido entre os meses de fevereiro de 2020 e junho de 2023. Nessas condições, se o agente iniciou os atos de perseguição antes da Lei 14.132/2021 e continua a praticá-los depois do novo diploma, no que tange às condutas que se enquadravam na contravenção penal de perturbação da tranquilidade não há falar em abolitio criminis, mas em continuidade normativa-típica. 4) Assim, deve incidir a norma penal anterior pela contravenção penal de perturbação à tranquilidade, no âmbito doméstico e familiar contra a mulher, nos termos do Decreto-lei 3.688/1941, art. 65, mesmo com sua revogação, em todo o período, pela ultratividade da norma penal mais benéfica. 5) Por outro lado, até o advento da Lei 14.188/2021, não eram punidas como crime, e nem mesmo como contravenção penal, as condutas que causassem violência psicológica contra a mulher, tipo penal imputado ao acusado, que ficou positivado no CP, art. 147-B Ressalte-se que tais condutas deverão ter sido praticadas a partir do dia 28/07/2021, data que entrou em vigor a referida lei, tendo em vista que se trata de novatio legis incriminadora, sendo, portanto, irretroativa. Na espécie, a denúncia diz que a violência psicológica contra a mulher ocorreu em diversas oportunidades, no período compreendido entre os meses de novembro de 2019 e junho de 2023. Nesse contexto, as condutas praticadas antes de 28/07/2021 não podem ser qualificadas como violência psicológica porque os fatos não eram previstos como crime, tornando-se evidente que podem ser imputados ao réu os supostos fatos ocorridos entre 29/07/2021 e junho de 2023. 6) No que tange ao preenchimento de requisitos para a configuração da continuidade delitiva, conforme bem asseverado pela d. Procuradoria de Justiça em seu parecer: ¿A questão da existência ou não do concurso de crimes (em continuação delitiva) deverá ser enfrentada na sentença pois se trata de matéria de direito¿. 7) Por fim, questiona a defesa técnica do recorrido a suposta falta de justa causa para a propositura da ação penal. No ponto, como a questão ainda não foi decidida em primeiro grau, não pode haver a análise da matéria diretamente pelo Tribunal, sob pena de vedada supressão de instância. Recurso parcialmente provido.
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