TJRJ. HABEAS CORPUS. CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA E POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO, ACESSÓRIOS E MUNIÇÕES. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONSUBSTANCIADO NA AUSÊNCIA DE REQUISITOS AUTORIZADORES DA CUSTÓDIA MÁXIMA, NA FUNDAMENTAÇÃO ABSTRADA DO DECISO E NA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA HOMOGENEIDADE. RESSALTA AINDA AS CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS DO PACIENTE. REQUER, EM SEDE LIMINAR AS SER CONFIRMADA POSTERIORMENTE, A REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA PREVENTIVA OU SUA SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO.
Não assiste razão à impetração. Consoante se infere dos autos principais, o ora paciente, e o corréu Gabriel de Lima Brito foram denunciados pela prática do crime descrito CP, art. 288-Ae Lei 10.826/2003, art. 16, c/c arts. 29 e 69 ambos do CP. A peça acusatória narra que no dia 06/04/2024, na parte da tarde, policiais militares receberam a informação de que milicianos estariam realizando extorsões ao comércio da comunidade Gardênia Azul, razão pela qual se dirigiram ao local para averiguações. Ao chegarem na comunidade, na esquina da rua Menta com a rua Monodora, os agentes visualizaram alguns indivíduos que, ao perceberem a chegada da guarnição policial, fugiram. Conforme a inicial, os policiais foram ao encalço dos milicianos e lograram êxito em capturar o denunciado Gabriel em posse de 01 (uma) pistola, 02 (dois) carregadores e 20 (vinte) munições intactas, na companhia do denunciado Hugo, sendo certo que a arma de fogo, o acessório e as munições estavam sob disponibilidade e uso de ambos os denunciados. Acresce a denúncia que os denunciados relataram aos agentes que são da localidade do «Marcão», bem como assumiram que recebem a importância de R$ 3.000,00 (três mil reais) mensais pelas atividades criminosas que desempenhavam. Configurado o estado flagrancial, o paciente e o corréu foram encaminhados à sede policial, onde foram adotadas as providências cabíveis. A prisão em flagrante foi convertida em preventiva pelo Juízo da Central de Custódia em 08/04/2024 (e-docs. 67/71 dos autos originários 0054112-71.2024.8.19.0001. Encaminhados os autos ao juízo natural, em decisão de 20/05/2024, foi recebida a denúncia e, em relação ao pleito libertário, o magistrado manteve a custódia em razão de não haver qualquer mudança fática ou jurídica que importe em sua revogação. Em análise aos autos, na limitada ótica de cognição sumária desta via, não há ilegalidade a ser aplacada, não havendo que ser acolhido o pleito formulado pela zelosa defesa. Na limitada ótica de cognição sumária, o deciso conversor foi devidamente lastreado em elementos concretos, nos termos do art. 93, IX, da CR/88 e CPP, art. 315. É certo que a gravidade abstrata do crime não pode servir como fundamento para o decreto da medida extrema. Contudo, o magistrado pode se valer da narrativa em concreto dos fatos imputados para concluir sobre o risco que a liberdade do agente poderia acarretar. A decisão que converteu a prisão em flagrante em preventiva se encontra suficientemente fundamentada e se baseia em dados concretos do caso. Atendidos os requisitos do CP, art. 312, bem como demonstrada justificativa idônea para a não aplicação das medidas cautelares diversas da prisão. Presente o fumus comissi delict, diante dos indícios suficientes de autoria e materialidade, decorrentes da situação de flagrante. Também se verifica o perigo que decorre da liberdade do paciente, que se alicerçou na garantia da ordem pública. Como bem exposto pelo juízo de piso, «No presente caso, atesta-se a presença do fumus comissi delicti pela prisão em flagrante dos custodiados, associados a milícia privada, exigindo dinheiro de comerciantes, em posse de uma pistola Marca SARSIOMAZ, Modelo B6, com 2 (dois) carregadores e 20 munições intactas e, ainda, pelas declarações prestadas em sede policial, em especial pela vítima. O periculum libertatis, definido como o risco provocado pela manutenção dos acusados em liberdade, está igualmente presente: trata-se de crime grave, em que os custodiados, associados a milícia privada, estavam em posse de arma de fogo e extorquiam comerciantes, deles exigindo dinheiro de forma ilegal, a título de «taxa". Consta do auto de prisão em flagrante que policiais militares estavam em diligências para verificar a conduta de alguns homens que estariam exigindo dinheiro de comerciantes na região da Gardênia Azul. Os agentes foram até o local e viram dois homens, que fugiram ao perceberem a aproximação dos agentes. Eles foram abordados e com eles apreendida a arma de fogo. Durante a abordagem os custodiados informaram que fazem parte da localidade do «Marcão» e que receberiam a quantia de R$ 3 mil por mês para desempenhar a atividade.» In casu, o julgador de piso não se restringiu a deduzir considerações abstratas ou a utilizar expressões vagas, tendo esclarecido suficientemente os motivos que o convenceram acerca da manutenção da custódia. Da leitura da decisão objurgada, vê-se que o magistrado mencionou a situação fática concreta em que se deu o acautelamento do paciente. Logo, por esta via de cognição sumária, percebe-se que estão presentes os requisitos do CPP, art. 312, sendo apresentada justificativa idônea para a não aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão. Por outro giro, descabida a alegação de carência de homogeneidade entre a medida cautelar e a eventual medida definitiva, em caso de procedência da pretensão punitiva. O CPP, art. 313, autoriza a prisão preventiva nos casos de crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos (inciso I), sendo este o caso dos autos. Ademais, tal assertiva afigura-se prematura e não passa de mero exercício de futurologia, pois a prova sequer foi judicializada, não estando, ademais, o regime de pena atrelado unicamente ao quantum da reprimenda. Impende gizar que o presente feito se encontra em estágio embrionário e o douto magistrado de piso, que colherá as provas, terá melhores condições de avaliar a necessidade da mantença da custódia do ora paciente. De outro giro, a existência de condições pessoais favoráveis, mesmo quando comprovadas, não obsta o ergástulo, quando presentes seus requisitos legais, como na hipótese dos autos, consoante reiteradamente decidido pela Corte Superior de Justiça (AgRg no RHC 151.571/BA, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, 5ª Turma, julg.: 14/12/2021; AgRg no HC 702.599/SP, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, 5ª Turma, julg.: 14/12/2021; e outros). Evidenciada a necessidade da custódia cautelar, resta afastada a pretensão de imposição de medidas cautelares menos gravosas, nos termos do CPP, art. 319, as quais não são suficientes ou adequadas à situação fática por incompatibilidade lógica. Constrangimento ilegal inocorrente. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA.
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