TJRJ. HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL E VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA CONTRA A MULHER E AMEAÇA NO CONTEXTO DA LEI 11.340/2006. INSURGÊNCIA CONTRA O DECISUM QUE MANTEVE A PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL EM VIRTUDE DE: 1) AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR; 2) VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA HOMOGENEIDADE; 3) EXCESSO DE PRAZO NA CONDUÇÃO DA MARCHA PROCESSUAL.
Não assiste razão à impetrante em seu desiderato heroico. O paciente foi preso em flagrante em 30/03/2024 pela suposta prática do delito previsto no art. 129, § 13, c/c art. 61, II, s «a» e «f», todos do CP, sob a égide da Lei 14.344/22 e da Lei 11.340/06. A prisão foi convertida em preventiva em 25/07/2023 pelo Juízo da Central de Custódia da Comarca da Capital, e posteriormente foi mantida a custódia cautelar pela autoridade coatora. Na presente impetração, a impetrante aduz haver retardo na marcha processual, sob o argumento de que a instrução criminal não foi concluída e que a Audiência de Instrução e Julgamento está designada para a data de 27/08/2024, o que enseja demora superior a 81 dias. Em relação ao deciso atacado, não há que se falar em ausência dos requisitos legais autorizadores da prisão cautelar, tampouco ocorre o alegado excesso de prazo, conforme será melhor examinado adiante. No que trata dos requisitos legais autorizadores da prisão cautelar, extrai-se dos autos que, no dia 29 de março de 2024, por volta das 15 horas e 30 minutos, no endereço lá indicado, o denunciado/paciente, de forma livre, consciente e voluntária, ofendeu a integridade física de Maysa, nascida em 06/12/2013, atualmente com 10 (anos), em menosprezo à sua condição de mulher, causando as lesões descritas no laudo de exame de corpo de delito, consistentes em e duas escoriações paralelas entre si com 70 mm e 50 mm de extensão compatível com cinto; escoriação em formato semilunar em face lateral de glúteo esquerdo com cerca de 140 mm em seu maior eixo; duas escoriações lineares e paralelas entre si em terço superior de perna direita com 20 e 25 mm de extensão cada uma; equimose enegrecida em joelho esquerdo. Consta, ademais, que momentos depois, por volta das 23 horas e 30 minutos, em outro endereço, o ora paciente, de forma livre, consciente e voluntária, ameaçou causar mal injusto e grave a Maysa, com os dizeres: Vou te enfiar a porrada e te matar! e mais uma vez, desferiu chineladas por todo o corpo da criança. O laudo de exame de corpo de delito da vítima é positivo para lesão corporal. Há indícios de autoria (fumus comissi delicti), consubstanciados na própria situação flagrancial em que se deu a prisão, além das declarações prestadas na delegacia. O periculum libertatis, ou seja, o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado (CPP, art. 312, sob a nova redação dada pela Lei 13.964/2019) , também está evidenciado, uma vez que o julgador destaca que permanece inalterado o quadro fático que propiciou a conversão da prisão em flagrante em preventiva. Por sua vez, destaque-se que na decisão conversora o juízo pontuou que: (...) logo após agredir, ameaçar e injuriar sua companheira MAYARA e sua enteada MAYSA, em situação fática que se enquadra à hipótese flagrancial descrita no, I do CPP, art. 302. . Apesar dos argumentos da defesa, a decisão encontra-se adequadamente fundamentada na gravidade em concreto do delito, tendo em vista que, no caso em apreço, resta evidenciado o perigo à integridade física e psíquica das vítimas, sua companheira e sua enteada, bem como o risco à ordem pública, uma vez que o paciente responde a ação penal referente à violência doméstica e familiar contra a mulher. Outrossim, em consonância com o disposto na Lei, art. 12-C, § 2º 11.340/2006, acrescido pela Lei 13.827/2019, Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso, o que se aplica ao caso vertente, no qual a integridade física da vítima está em perigo. De outro giro, nos termos do CPP, art. 315, § 1º (incluído pela Lei 13.964, de 2019), a contemporaneidade dos fatos a justificar a prisão está demonstrada, pois o paciente foi detido em flagrante. Descabida também a alegação de violação ao princípio da homogeneidade, porquanto, em caso de possível condenação, será sopesado o CP, art. 59 para a fixação da pena, e o art. 33, §3º, do CP para o estabelecimento do regime, não estando este último atrelado unicamente ao quantum da reprimenda. Ademais, a Lei Maria da Penha tem como escopo a proteção da mulher que se encontra em situação de vulnerabilidade, sendo certo que a prisão preventiva é um dos mecanismos que pode ser utilizado para a preservação da integridade física e psicológica da vítima (Lei 11.343/2006, art. 12-C, 2º). Por sua vez, em relação ao alegado excesso de prazo, é cediço que os prazos na condução da instrução criminal não devem ser contados de forma meramente aritmética, mas, sobretudo, com a invocação do Princípio da Razoabilidade, tendo em vista as peculiaridades do caso concreto, consoante pacífico entendimento jurisprudencial (AgRg no RHC 138.721/BA, Rel. Ministro João Otávio De Noronha, Quinta Turma, julgado em 19/10/2021; AgRg no RHC 151.724/RJ, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 05/10/2021). Vale registrar que é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que mesmo que existam prazos fixados pela lei para conclusão da instrução criminal, a fim de se garantir maior celeridade no processamento e julgamento das demandas, é necessário sempre ser verificada a relativização de tais prazos, uma vez que não são absolutos. Assim, o melhor entendimento é o de que a flexibilização é possível e nessa esteira o excesso, para caracterizar o constrangimento ilegal, será somente aquele que for injustificado, resultante da negligência ou displicência por parte do juízo. Do compulsar dos autos, vê-se que a Audiência de Instrução e Julgamento já se avizinha, designada a data de 27/08/2024. Assim, após o interrogatório do ora paciente, a instrução processual será, por certo, encerrada. Destarte, não há que se falar em inércia do Juízo, razão pela qual inexiste ilegalidade a ser sanada. Tampouco se afigura plausível a substituição da custódia cautelar pela imposição das medidas diversas da prisão, previstas no CPP, art. 319. Para além da gravidade abstrata do crime, o que não pode ser causa suficiente para prisão, a gravidade concreta, como se observa no caso, é idônea a apontar o perigo que representa a liberdade do paciente. Pois bem, conforme já mencionado linhas atrás, em consonância com o disposto na Lei, art. 12-C, § 2º 11.340/2006, acrescido pela Lei 13.827/2019, Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso, o que se aplica ao caso vertente, no qual a integridade física da vítima está em perigo. Nesse contexto, não se vislumbra constrangimento ilegal pelo qual esteja sendo submetido o paciente, mostrando-se inadequada a revogação da prisão ou a substituição por medidas acauteladoras diversas da prisão, previstas no CPP, art. 319. Por fim, não obstante a ausência de constrangimento ilegal a ser remediado, o princípio da proporcionalidade alvitra que se recomende ao D. Juízo a quo que, tão logo finda a instrução e apresentadas as alegações finais, diligencie visando à célere efetivação da entrega da prestação jurisdicional. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA, com recomendação.
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