TJRJ. APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO, PORTE COMPARTILHADO DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO ¿ COM NUMERAÇÃO RASPADA -, E RESISTÊNCIA. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA QUE SE REJEITA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE RECEPTAÇÃO PARA O DE RECEPTAÇÃO CULPOSA PARA O ACUSADO WALLACE. INVIABILIDADE. DOSIMETRIA QUE NÃO DESAFIA AJUSTE. REGIME PRISIONAL INTERMEDIÁRIO MANTIDO 1)
Emerge firme da prova judicial que policiais federais rodoviários se encontravam em patrulhamento pela Rodovia Washington Luiz quando tiveram a atenção voltada para o veículo citado na denúncia, que por eles passou em alta velocidade, razão pela qual seguiram em seu encalço na intenção de abordar seus ocupantes. Em meio à perseguição, foi observado que o acusado Rafael se debruçou para fora da janela dianteira do carona e efetuou vários disparados de arma de fogo em direção à guarnição policial, que revidou a injusta agressão, sendo certo que somente após a colisão do veículo que era ocupados pelos denunciados que se fez possível a abordagem, onde foram arrecadados com os acusados 01 arma de fogo, com três estojos vazios e 01 munição percutida e não deflagrada, 01 dispositivo denominado ¿Jammer¿ - utilizado comumente por roubadores de carga para bloquear o sinal rastreador de caminhões -, um simulacro de pistola, além de um rádio transmissor e dois aparelhos celulares. Em consulta realizada ao sistema, foi constatado que o veículo conduzido por Wallace e ocupado por Rafael e Jorge, era produto de crime de roubo e ostentava placa inidônea. 2) Materialidade e autoria delitivas que restaram devidamente demonstradas, com base nos laudos periciais e na prova oral colhida em juízo, consistente nos testemunhos harmônicos e coerentes prestados pelos policiais federais rodoviários que realizaram a prisão em flagrante dos apelantes, a apreensão do veículo utilizado ¿ objeto de roubo e com sinais característicos adulterados -, da arma de fogo, 01 dispositivo denominado ¿Jammer¿ - utilizado comumente por roubadores de carga para bloquear o sinal rastreador de caminhões -, um simulacro de pistola, além de um rádio transmissor e dois aparelhos celulares. À míngua de prova em contrário acerca de sua idoneidade, os depoimentos dos agentes públicos merecem prestígio, a teor do verbete 70 da Súmula desta Corte. 3) Registre-se que a afirmação dos acusados, no sentido de desconhecer a origem ilícita do veículo, não se coaduna com a prova dos autos, uma vez que, se fosse verdade, não haveria motivos para que eles tenham buscado se evadir da abordagem policial, e menos ainda que tenham se utilizado de uma arma de fogo, para efetuar disparos contra os policiais, com o fito de evitar a referida abordagem. 3.1) Assinale-se, por oportuno, que o dolo do crime de receptação extrai-se das próprias circunstâncias do flagrante, cabendo à defesa apresentar prova da origem lícita do bem ou de eventual conduta culposa, consoante a regra de repartição do ônus probatória disposta no CPP, art. 156, do qual não se desincumbiu a defesa, inviabilizando assim o acolhimento dos pleitos direcionados à absolvição ou desclassificação para receptação culposa. Precedente. 3.2) Nesse contexto, não restam dúvidas de que se formou arcabouço probatório seguro para manter a condenação dos acusados pelo crime de receptação, fulminando a alegação de inexistência do elemento subjetivo do crime de receptação, o que inviabiliza o acolhimento do pleito absolutório, ou a desclassificação para a modalidade culposa. 4) Com relação ao crime de posse compartilhado de arma de fogo, as circunstâncias que envolveram a prisão em flagrante dos réus: Wallace sendo visualizado na condução do veículo que empreendeu fuga quando os policiais determinaram a sua parada, e de onde Rafael, sentado no banco do carona ao lado de Wallace, efetuou disparos de arma de fogo contra os policiais, buscando evitar a abordagem policial, enquanto Jorge se encontrava sentado no banco traseiro do veículo, ao lado de um simulacro de pistola, evidenciam a existência de liame subjetivo entre os agentes na prática delitiva, bem assim, tendo plena ciência e disponibilidade do artefato, o que configura o porte compartilhado, mesmo que Wallace e Jorge não portassem nenhuma arma. 5) Com relação ao crime de resistência armada, a própria dinâmica descrita, demonstra que todos os ocupantes do veículo estavam em divisão de tarefas com o mesmo propósito de resistir à ordem legal de parada: enquanto o Wallace conduzia o veículo em fuga, Rafael disparava contra a guarnição, enquanto Jorge permanecia sentado no banco traseiro do veículo, dando apoio e suporte às ações dos demais. Portanto, desnecessário perquirir, para firmar a autoria, quem fora o executor dos disparos. 5.1) Como cediço, aqueles que não executam a ação ou omissão consubstanciada no núcleo do tipo, mas concorrem de qualquer modo para o crime, realizam uma conduta que se torna relevante penalmente em virtude do enquadramento de subordinação ampliada (CP, art. 29). 5.2) É a norma de extensão, que torna relevante qualquer espécie de concurso e transforma em típica uma conduta que, em si, poderia ser atípica. Positivada a relevante atuação do agente em prol do evento, tem-se por caracterizada a estruturação jurídica da coautoria, como ocorre no caso em apreço. 5.3) Havendo pluralidade de condutas com relevância causal, intenção de participar da ação comum e homogeneidade do elemento subjetivo, pouco importa a quem efetivamente competiram os atos de execução, pois a coautoria é a realização conjunta de um delito por várias pessoas que colaboram consciente e voluntariamente; e embora as contribuições dos coautores para a concretização do fato criminoso possam materialmente variar, o resultado total deve ser debitado a cada um. Precedentes. 6) Com relação à dosimetria, que não foi objeto de irresignação defensiva, observa-se que as circunstâncias judiciais foram consideradas pelo magistrado favoráveis. Seguindo essa linha de raciocínio, as penas-bases permanecem no mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, para o delito do CP, art. 180, caput, 03 (três) anos e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, para o delito do Lei 10.826/2003, art. 16, § 1º, IV, e 02 (dois) meses de detenção, para o delito do CP, art. 329, caput. 6.1) Na fase intermediária, o magistrado reconheceu a atenuante da menoridade relativa, para os acusados Jorge e Rafael, porém, sem repercussão sobre o quantum de pena, por força da Súmula 231/STJ. 6.2) Na terceira fase, não há causas de aumento ou de diminuição a considerar, motivo pelo qual as penas se assentam, em definitivo, nos patamares antes indicados: 1 (um) ano de reclusão e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, para o delito do CP, art. 180, caput, 03 (três) anos e 10 (dez) dias-multa, no valor unitário mínimo legal, para o delito do Lei 10.826/2003, art. 16, § 1º, IV, e 02 (dois) meses de detenção, para o delito do CP, art. 329, caput. 7) Considerando que os crimes foram praticados por desígnios autônomos, mantêm-se o concurso material de crimes e a resposta penal em 04 (quatro) anos de reclusão e 02 (dois) meses de detenção, e ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa. 8) Por fim, mantem-se o regime intermediário para o desconto das penas corporais, uma vez fixado nos exatos termos do art. 33, §2º, ¿b¿, do CP. Desprovimento do recurso.
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