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DOC. 423.8526.9321.9712

TJRJ. Apelação criminal interposta pelo Ministério Público. Imputação do crime de tráfico de drogas. Juízo sentenciante que, não obstante tenha reconhecido a higidez do conjunto probatório no que diz respeito à materialidade e à autoria do crime previsto na Lei 11.343/06, art. 28, optou por absolver o acusado por entender que a respectiva norma padece de inconstitucionalidade. Recurso que busca a condenação do réu pela prática de crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput). Mérito que se resolve parcialmente em favor da Acusação. Instrução revelando que policiais militares em patrulhamento de rotina, se depararam com o Apelado, em notório ponto de comércio espúrio (dominado pela facção TCP), o qual, tão logo percebeu a presença da guarnição, dispensou algo embaixo de um carro que estava estacionado na via. Em revista pessoal, nada foi encontrado com o Apelado, porém o material por ele dispensado foi arrecadado, tratando-se de 10,10g de cocaína (09 embalagens individuais), contendo as inscrições «TCP; PERÓ PAZ; 20», sendo, ainda, arrecadados no local 13,5g de maconha (04 tabletes), que não se confirmou pertencer a ele. Acusado que, na DP, afirmou «que é pescador e comprou as drogas para levar para pescaria". Em juízo, alegou que estava na posse de apenas um cigarro de maconha e um pino de cocaína para consumo próprio, versão que não encontra respaldo em qualquer contraprova defensiva (CPP, art. 156). Testemunho policial sufragado pela Súmula 70/TJERJ. Prova inequívoca da materialidade e autoria. Inexistência, contudo, de qualquer outro elemento capaz de evidenciar a finalidade difusora, ciente de que «nenhuma acusação se presume provada» e que «não compete ao réu demonstrar a sua inocência» (STF). Conjecturas que não bastam a tal desiderato. Acusado que não estava sendo monitorado, nem foi flagrado na execução de qualquer ato indicativo do comércio espúrio ou prática capaz de levar a tal conclusão. Inexistência de investigação prévia. Abordagem policial fruto do mero acaso, já que os agentes se encontravam em patrulhamento de rotina. Pequena quantidade toxicológica apreendida, não indicativa de estrita comercialização. Eventual «confissão informal», supostamente feita pelo réu aos policiais por ocasião da abordagem, que não teve ressonância posterior nos relatos que prestou na DP ou em juízo, sendo de qualquer sorte inválido esse tipo de elemento de convicção (STF). Princípio da íntima convicção que há de ceder espaço ao da livre persuasão racional (CPP, art. 155), devendo a decisão estar lastreada em evidências inequívocas, ao largo de convicções pessoais extraídas a partir de deduções inteiramente possíveis, porém não integralmente comprovadas, estreme de dúvidas. Estado de dubiedade sobre o elemento subjetivo do tipo original que se resolve pela solução de menor restritividade penal, na linha de precedentes do TJERJ. Viabilidade de o juiz valer-se do instituto da emendatio libelli (CPP, art. 383) para proceder à reclassificação típica da imputação, variando, à luz da narrativa factual posta, do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei . 11.343/06) para o de consumo próprio (art. 28 do mesmo Diploma), sem que se cogite sobre eventual inobservância do princípio da correlação. Advertência do STJ enfatizando que, «se a imputatio facti, explícita ou implicitamente, permite definição jurídica diversa daquele indicada na denúncia, tem-se a possibilidade de emendatio libelli (CPP, art. 383)". Tipo da Lei 11.343/2006, art. 28 que encerra definição de crime formal, de perigo abstrato, cujo bem jurídico tutelado recai sobre a saúde pública. Tema recentemente apreciado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 365.659), que declarou a inconstitucionalidade, sem redução de texto, da Lei 11.343/06, art. 28, para «afastar a repercussão criminal do dispositivo em relação ao porte de cannabis sativa para uso pessoal», ocasião em que o STF ressaltou o «respeito às atribuições do Legislativo; cabe aos parlamentares - e a ninguém mais - decidir sobre o caráter ilícito do porte de drogas, ainda que para uso pessoal.» No caso específico dos autos, o acusado foi flagrado na posse de cocaína, sendo, portanto, inaplicável o precedente da Suprema Corte. Preceito legislado imputado, fruto da legítima atividade legiferante do Estado e expedido segundo o CF, art. 22, I/88. Juízos de condenação e tipicidade que se revisam, nos termos da Lei 11.343/06, art. 28. Dosimetria que se apura, atento à reincidência do Apelado (cf. anotação 2 da FAC do e-doc 120250951 - art. 33 da LD), à quantidade do entorpecente arrecadado e às características do fato, considerando especialmente que a conduta tangenciou a imputação inerente ao tráfico, revelando, assim, censurabilidade qualificada (CP, art. 59; Lei 11.343/06, art. 42). Recurso a que se dá parcial provimento, a fim de condenar o acusado pelo crime do art. 28 da Lei . 11.343/06, à pena final de prestação de serviços à comunidade, pelo prazo de 06 (seis) meses, a cargo do juízo da execução, observada eventual detração.

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