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DOC. 675.2824.9343.4519

TJRJ. RECURSOS DE APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. ALEGAÇÃO DE NÃO CONTRATAÇÃO. CONTRATAÇÃO DIGITAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE REGULARIDADE. CONDUTA IMPRÓPRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA.

Cogente a incidência do CDC, porquanto autor e réu inserem-se respectivamente no conceito de consumidor e de fornecedor, consagrados nos arts. 2º e 3º, caput, do CDC. Na hipótese dos autos, sustenta a parte autora que jamais contratou com a parte ré, tendo se deparado com descontos que descobriu se tratar posteriormente de empréstimo consignado nunca contraído. Postulara, por isso, a devolução dos valores ilegitimamente descontados em seu benefício previdenciário e compensação por danos morais. Em sua exordial, se dispõe a depositar judicialmente a quantia indevidamente creditada em sua conta corrente. Em sua contestação, a parte ré defendera a regular contratação em ambiente digital mediante a inserção de dados pessoais intransferíveis do consumidor. Apontara, ainda, que (i) a parte autora não demonstrou os fatos constitutivos do seu direito, (ii) a inaplicabilidade da inversão do ônus da prova, (iii) a inexistência de danos imateriais e (iv) o descabimento da repetição do indébito (doc. 89). Ora, não só incumbia à parte ré demonstrar a regular celebração da avença impugnada, por ser descabida a imposição de prova negativa à parte autora, como deferida a inversão do ônus da prova (doc. 175), decisão irrecorrida e, por isso, preclusa. Contudo, a parte ré instruíra sua peça defensiva tão-somente com documentos produzidos unilateralmente, sem a rubrica da demanda, e fotografia selfie, acervo que não se mostra apto a corroborar a regular contratação de empréstimo impugnado, notadamente quando desde sua exordial a parte autora intenta o depósito judicial do valor inadvertidamente disponibilizado em sua conta corrente. Não bastasse, nessas hipóteses, a jurisprudência alerta que amplamente notória a possibilidade de fraude por meio virtual, motivo pelo qual a existência de uma selfie não comprova, por si só, que qualquer avença é devida, especialmente quando o próprio consumidor impugna a documentação, como no caso dos autos. Precedentes. Com efeito, a contratação digital deve ser demonstrada pela instituição financeira mediante a apresentação de dados criptografados devidamente comprovados, o que não fez a parte ré que, repita-se, sequer requereu prova pericial para atestar a regularidade da contratação digital, com apresentação de assinatura eletrônica ¿ biometria facial, na forma do CPC, art. 373, II. Ressalte-se, por oportuno, que a possibilidade de ser alvo de falsários constitui risco interno decorrente da atividade da empresa, que deveria tomar as precauções necessárias para evitar fraudes. Não se pode exigir que o consumidor suporte o ônus de defeitos na prestação do serviço. Logo, torna-se o fornecedor, ao prestar um serviço, responsável por qualquer dano que venha o consumidor a sofrer, na medida em que é ônus do fornecedor fazer a prova de que o defeito no serviço inexiste ou de alguma excludente do nexo causal, sendo de certa forma desdobramento lógico do próprio risco da atividade por ele desenvolvida no mercado de consumo. Nessa toada, exsurgem os fatos constitutivos do direito do autor, bem como a falha no serviço prestado pela parte ré. Logo, irretocável a declaração de inexistência de débito e repetição do indébito. No que tange ao dano moral, configura-se in re ipsa, derivando, inexoravelmente, do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provado este fato, ipso facto, está demonstrado o dano moral, numa típica presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum, especialmente, quando os descontos incidem em benefício previdenciário de pessoa idosa. Merece prosperar, portanto, a irresignação da parte autora em seu recurso adesivo. Nesse passo, considerando as circunstâncias do caso concreto, a condição de pessoa idosa, potencial comprometimento de sua subsistência com os descontos efetuados, revela-se razoável a fixação de valor reparatório em R$ 6.000,00 (seis mil reais), quantum compensatório em sintonia com julgados dessa Corte em casos análogos e que deve ser corrigido monetariamente desde o presente julgado e acrescido de juros moratórios a partir da citação. Dada a reforma parcial da sentença e procedência do pedido compensatório, patente a existência de comando condenatório, motivo pelo qual a verba honorária deve possuir como base de cálculo o valor da condenação, nos termos do CPC, art. 85, § 2º. Finalmente, não merece prosperar a irresignação defensiva quanto à devolução em dobro dos valores descontados com fulcro no CDC, art. 42, porquanto a repetição em dobro é cabível quando a cobrança indevida consubstancia conduta contrária à boa-fé objetiva, o que independente da natureza do elemento volitivo e se verifica no caso em tela dada a insurgência extrajudicial da parte autora. Recurso defensivo desprovido. Recurso autoral provido.

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