TJRJ. APELAÇÃO. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT E 35, AMBOS DA LEI 11.343/2006) . RECURSO DEFENSIVO FORMULANDO AS SEGUINTES TESES: 1) INÉPCIA DA DENÚNCIA; 2) ABSOLVIÇÃO SOB O ARGUMENTO DE PRECARIEDADE DAS PROVAS; 3) MITIGAÇÃO DAS PENAS AOS PATAMARES MÍNIMOS LEGAIS; 4) AFASTAMENTO DA AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA E/OU A REDUÇÃO DO QUANTUM DE AUMENTO; 5) APLICAÇÃO DO § 4º Da Lei 11.343/06, art. 33; 6) ABRANDAMENTO DO REGIME DE PRISÃO; 7) SUBSTITUIÇÃO DA PPL POR PRD.
A defesa inicia o seu inconformismo atacando a peça vestibular, inquinando-a de inepta no que concerne ao delito de associação para o tráfico. Contudo, a mera leitura deixa a certeza de que a exordial acusatória atende suficientemente aos requisitos do CPP, art. 41, uma vez que narra os fatos com todas as suas circunstâncias possíveis, garantindo a ampla defesa e o contraditório, como plenamente exercidos até a presente fase processual, não havendo falar-se em inépcia da peça inaugural, que demonstra, perfeitamente, a existência de um liame entre o agir e a suposta prática delituosa, estabelecendo a plausibilidade da imputação e possibilitando o exercício da ampla defesa. Demais disto, «A superveniência de sentença penal condenatória de cognição exauriente torna prejudicada a alegação de inépcia da denúncia, não havendo razão para a análise da higidez formal da persecução penal se da condenação já se presume o acolhimento formal e material da inicial acusatória. Esta Corte Superior tem entendimento de que, em homenagem ao CPP, art. 563, não se declara a nulidade do ato processual - seja ela relativa ou absoluta - se a arguição do vício não vier acompanhada da prova do efetivo prejuízo para a parte, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief". (AgRg no AREsp. Acórdão/STJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/03/2022, DJe 28/03/2022). Preliminar rejeitada. Quanto ao mais, emerge dos autos que, no dia 20/04/2023, por volta das 06 horas, o recorrente, em comunhão de ações e desígnios com Vitor Souza de Oliveira Vicente e Igor Mendes Pereira, não flagranteados, bem como aos demais integrantes da facção criminosa autodenominada Comando Vermelho, guardava e tinha em depósito para fins de tráfico, 180g de cocaína em forma de crack, acondicionados em 720 sacos plásticos, sendo 600 com as inscrições «CV R$ 15,00» e 120 com as inscrições «CV R$30,00"; 2.200g de cocaína em pó, acondicionados em 2.145 frascos plásticos transparentes, sendo 400 com as inscrições «NAÇÃO», 405 com as inscrições «CV R$20,00», 500 com as inscrições «CV R$30,00 BGN LULA» e 840 com as inscrições «CV R$15,00 CHEIROU PANCOU"; e 2.300g de maconha, acondicionados em 425 tabletes, sendo 350 com as inscrições «CV R$20,00 HIDROPÔNICA» e 75 com as inscrições «CV R$ 50,00 GESTÃO INTELIGENTE". Consta que policiais militares, alertados sobre a existência de mercância de entorpecentes na localidade, se dirigiram até Estrada da Liberdade, Quarteirão Italiano, onde avistaram três indivíduos no interior de uma residência, que ao perceberem a presença da guarnição policial, empreenderam fuga, sendo certo que após uma breve perseguição os agentes estatais lograram prender o recorrente. O tipo penal previsto no caput, da Lei 11.343/06, art. 33, é crime de natureza múltipla (multinuclear), de sorte que a prática de qualquer uma das condutas descritas no preceito primário da norma caracteriza o tráfico de drogas. A intenção de difusão ilícita não se caracteriza apenas por meio do flagrante da venda direta das substâncias aos usuários, mas também pode ser demonstrada por meio de outras circunstâncias. Assim, a presença da droga arrecadada, pronta à comercialização no varejo, tudo na conformidade dos respectivos auto de apreensão e laudos periciais, aliado, ainda, às circunstâncias da prisão em flagrante e aos depoimentos firmes e coerentes das testemunhas policiais, tornam evidente a prática do delito previsto na Lei 11.343/06, art. 33, caput, não havendo falar-se, portanto, em conjunto probatório anêmico. Nessa linha de raciocínio, falece a pretendida absolvição, porquanto caracterizadas as condutas previstas na Lei 11.343/06, art. 33. De igual modo, o acervo dos autos comprova de maneira indubitável a existência de uma associação para o tráfico de drogas, integrada pelo apelante e outros indivíduos da facção Comando Vermelho. Estão presentes elementos empíricos que, conjugados com aqueles colhidos no curso da instrução probatória, demonstram a indisfarçável prática do delito da Lei 11.343/06, art. 35. a) é fato notório, que independe de prova, a existência de facções criminosas dedicadas ao narcotráfico instaladas em diversas comunidades do Estado do Rio de Janeiro; b) segundo o relato do agentes da lei, cujas palavras merecem credibilidade a teor do que dispõe o verbete 70, da súmula deste Sodalício, o local onde o apelante se encontrava é dominado pela facção criminosa autodenominada Comando Vermelho; c) ainda segundo os seguros relatos dos policiais, o recorrente, alcunhado de «Tiulim», é o líder o tráfico de drogas na Vila São José; d) o recorrente guardava uma grande quantidade e diversidade de drogas com inscrições alusivas ao tráfico local, tais como, CV R$ 15,00», «CV R$30,00», «NAÇÃO», «CV R$20,00», «CV R$30,00 BGN LULA», «CV R$15,00 CHEIROU PANCOU», «CV R$20,00 HIDROPÔNICA» e «CV R$ 50,00 GESTÃO INTELIGENTE», não sendo crível que realizasse a mercancia ilícita naquela localidade sem que estivesse associado àquela facção criminosa; e) tal condição de estabilidade não foi afastada por nenhuma prova existente nos autos. Impossível a concessão do redutor contido no § 4º, do art. 33, da Lei de drogas, ante a condenação pelo delito de associação para o tráfico, ficando configurada circunstância impeditiva do benefício, qual seja, a dedicação à atividade criminosa. No que diz respeito à resposta penal, na 1ª fase dosimétrica, as penas aplicadas mostram-se totalmente desamparadas da necessária fundamentação concreta ao exaspero promovido, restando inidoneamente justificadas cada qual das suas elementares, à execeção da grande quantidade de entorpecente apreendido, que autoriza o recrudescimento das bases em 1/6. Na segunda etapa, mostra-se inafastável a agravante da reincidência, em razão da condenação com trânsito em julgado da sentença em 23/10/2020, nos autos do processo 0002833-8.2017.8.19.0063 (anotação 2 da FAC), aplicando-se a fração de 1/6, aumento que se apresenta mais adequado e em sintonia com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. A propósito das alegações defensivas, o reconhecimento da agravante da reincidência baseado em folha de antecedentes criminais não configura constrangimento ilegal, sendo desnecessária a comprovação por meio de apresentação de certidão cartorária judicial. HC 211131 / SP - Relator Ministro Og Fernandes - Sexta Turma - Julgamento 06/09/2011 - Publicação/Fonte Dje 19/09/2011). Quanto a segunda tese defensiva, de afastamento da reincidência, sob o argumento de que ela materializa o reexame de um episódio que já foi objeto de uma sentença condenatória transitada em julgado, configurando bis in idem na punição do acusado, não encontra respaldo na melhor doutrina e na jurisprudência. A reincidência não se reveste de inconstitucionalidade. Pelo contrário, mostra-se em perfeita harmonia com o princípio constitucional da individualização da pena. Tal declaração valeria também para todos os outros efeitos da reincidência, fazendo com que ficasse prejudicado todo consagrado sistema de política criminal de combate à delinquência. A Suprema Corte tem reafirmado a constitucionalidade da aplicação do instituto da reincidência como causa agravante da pena em processos criminais: «O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE 453.000, Rel. Min. Marco Aurélio, após reconhecer a repercussão geral da matéria, assentou a constitucionalidade da aplicação da reincidência como agravante da pena em processos criminais. 4. A decisão está devidamente fundamentada, embora em sentido contrário aos interesses da parte agravante. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.» (ARE 908464 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 22/09/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-202 DIVULG 07-10-2015 PUBLIC 08-10-2015). Em face do quantum de pena aplicado, bem como da reincidência, o regime inicial fechado é o único capaz de dar vazão aos objetivos punitivo e preventivo da pena, tudo com base nas disposições do art. 33, § 2º, «a», e § 3º, do CP. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, em função da elevada pena imposta. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Não perca tempo. Cadastre-se e faça agora sua assinatura ADM Direito