128 - TJRJ. Apelação criminal da Defesa. Condenação por tráfico de drogas. Recurso defensivo que argui, preliminarmente, a nulidade por violação de domicílio, a imprestabilidade da suposta confissão informal, obtida sem observância à advertência do direito ao silêncio (Aviso de Miranda) e por cerceamento de defesa, decorrente do indeferimento de diligência requerida pela defesa (busca e apreensão das câmeras dos policiais envolvidos na ocorrência). No mérito, almeja a absolvição por suposta fragilidade probatória, a desclassificação para o art. 28 da LD, a incidência do privilégio, a revisão da dosimetria, o abrandamento de regime, a detração e a gratuidade. Preliminar defensiva de violação ao domicílio que não reúne condições de acolhimento. Instrução reveladora de que policiais militares, a partir do recebimento de delação da vítima de roubo, apurado no RO 134-09025/2022, no sentido de que o Apelante estaria na posse do celular subtraído três dias antes, diligenciaram ao local informado. Ato contínuo, os agentes foram atendidos pelo Recorrente no portão. Ao ser indagado acerca do roubo, negou a participação no crime, mas, ao ser questionado sobre a existência de algo ilícito no interior da sua casa, teria admitido a posse de uma bucha de maconha e teria franqueado a entrada dos policiais em sua residência (em audiência de custódia, o Réu nada falou acerca de eventual ingresso irregular). Recorrente que exerceu o direito ao silêncio na DP e em juízo. Busca residencial assentida, com arrecadação, em cima da mesa, de uma bucha de maconha, de uma planta de maconha no quintal, e, no interior do veículo estacionado na garagem, de 59 invólucros plásticos com erva seca, totalizando 335g de maconha, além de um coldre e uma balança de precisão. Apelante conduzido à Delegacia de Polícia e reconhecido pela vítima do roubo do celular. Orientação do STJ, em casos como tais, no sentido de que «o ingresso em moradia alheia depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão e permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio". Situação apresentada que, diante desse quadro, não tende a expor qualquer nulidade ou eventual ilicitude das provas por inviolabilidade domiciliar, considerando que o ingresso domiciliar se deu após o próprio Réu noticiar a existência de droga em seu poder, no interior de sua casa, franqueando o acesso ao interior de sua casa aos policiais, situação que tende a confortar a legitimidade da palavra dos policiais na espécie. Assim, por se tratar de crime de natureza permanente, houve justa causa a legitimar a atuação oficial, «prescindindo de mandado judicial, qualquer que seja sua natureza» (STF). Alegação de imprestabilidade da confissão informal, em razão de falta de comunicação ao Réu sobre o direito ao silêncio (Aviso de Miranda) que não exibe ressonância prática na espécie. Legislação processual penal que não exige «que os policiais, no momento da abordagem, cientifiquem o abordado quanto ao seu direito em permanecer em silêncio (Aviso de Miranda), uma vez que tal prática somente é exigida nos interrogatórios policial e judicial» (STJ). Hipótese em que, além das peças policiais indicarem que o réu foi cientificado do direito ao silêncio, em sede inquisitorial e em juízo, o mesmo optou por não prestar declarações formais, pelo que não se cogita de qualquer prejuízo decorrente (STJ). Terceira preliminar igualmente rejeitada. CPP, art. 396-Aque, na linha do princípio da concentração procedimental (STJ), impõe à defesa o ônus de «oferecer documentos e justificações, especificar as provas pretendidas e arrolar testemunhas», tudo sob pena de preclusão (STJ). Caso dos autos em que foi colhido o depoimento do policial, na AIJ do dia 28.02.2023, mas, somente ao final da audiência de continuação, realizada quase dois meses após, em 18.04.2023, é que a defesa do Acusado requereu a realização de diligência para a obtenção das imagens das câmeras acopladas às fardas dos policiais responsáveis pelo flagrante. Postulação formulada fora do permissivo do CPP, art. 402, certo de que o objeto da diligência não se originou exclusivamente dos fatos e circunstâncias apurados na instrução, sendo passível de ser requerida desde a fase do CPP, art. 396-A Prerrogativa do juiz de indeferir diligências inviáveis ou protelatórias, em reverência ao princípio do dinamismo procedimental (TJERJ). Indeferimento judicial incapaz de ensejar qualquer consequência nulificadora, até porque não evidenciada a ocorrência de prejuízo concreto decorrente. Mérito que se resolve em parcialmente em favor do Recorrente. Prova inequívoca de que o Apelante guardava e tinha em depósito, para fins de tráfico, o total de 355g de maconha, no formato de erva seca picada, acondicionadas em 60 «sacolés» e 1 (uma) planta Cannabis Sativa, medindo aproximadamente 30cm de altura. Testemunho policial ratificando a versão restritiva, suficiente a atrair a primazia da Súmula 70/TJERJ c/c CPP, art. 155. Instrução judicial que contou unicamente com o testemunho de um agente responsável pelo flagrante, a qual a defesa tenta descredenciar, sem o respaldo de qualquer contraprova defensiva, embora lhe fosse possível ter arrolado a esposa do réu, que presenciou a prisão em flagrante dele. Ambiente jurídico-factual que, pela quantidade do material entorpecente, sua forma de acondicionamento e circunstâncias da prisão, não deixa dúvidas quanto à procedência da versão restritiva, sobretudo a finalidade difusora. Improcedência da pretensão desclassificatória. Apesar de o policial ter afirmado que o réu assumiu a propriedade de uma bucha de maconha, alegando que seria para consumo próprio, houve arrecadação de outras 59 buchas de droga, idênticas à primeira apreendida, totalizando quantidade global de entorpecente incompatível com a destinação para consumo próprio. Concessão do privilégio que se faz. Réu tecnicamente primário, sem antecedentes válidos (Súmula 444/STJ) e sem indicações concretas de que se dedica às atividades criminosas. Jurisprudência consolidada no âmbito do STF e do STJ, aduzindo, de um lado, que a quantidade do material entorpecente não pode ser manejada, por si só, para refutar o privilégio, o mesmo devendo ser dito em face de «investigações preliminares ou processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase recursal, sob pena de violação do art. 5º, LIV, da CF/88". Juízos de condenação e tipicidade, nesses termos, retificados para o art. 33, §4º, da LD, reunidos que se encontram todos os seus elementos constitutivos. Dosimetria que comporta ajuste. Depuração da pena-base que não viabiliza a consideração indireta de registros penais inconclusivos, em burla reflexa à Súmula 444/STJ, para negativar circunstância judicial, mesmo sob a rubrica da conduta social ou personalidade do agente. Descarte da negativação pela quantidade/nocividade de droga, com repercussão de tal circunstância terceira fase. Pena-base restabelecida ao patamar mínimo, inalterado na segunda fase. Modulação do privilégio que se faz segundo a fração de 1/2, considerando as circunstâncias concretas do evento, sobretudo a razoável quantidade do material apreendido, a ponto de flertar com a própria negativa do benefício. Regime prisional que, mesmo em sede de crime hediondo ou equiparado, há de ser depurado segundo as regras do CP, art. 33 (STF), optando-se, na espécie, pela modalidade aberta, considerando o volume de pena e a disciplina da Súmula 440/STJ, seguindo-se a substituição da PPL por duas restritivas. Detração não depurada pela sentença e que, a essa altura do procedimento, repassa para a VEP a respectiva competência. Pleito de isenção das custas processuais que se mostra inviável, por se tratar de questão a ser resolvida no processo de execução (Súmula 74/TJERJ). Preliminares rejeitadas e recurso parcialmente provido, para reconhecer o privilégio do tráfico e redimensionar as sanções finais para 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, além de 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa, no valor mínimo legal, em regime aberto, com substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, a escolha do juízo da execução, com expedição de alvará de soltura.
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